Agnès Varda estreia o último documentário de sua carreira, 'Visages, villages'

Ao lado do fotógrafo JR, ela percorre o interior da França produzindo fotos gigantes de pessoas comuns e descobrindo o extraordinário

por Estadão Conteúdo 25/01/2018 09:13

Fênix Filmes/Divulgação
JR e Agnès Varda viajaram na caminhonete dele, em formato de câmera fotográfica, para fazer as filmagens do documentário. (foto: Fênix Filmes/Divulgação)

O título é simples: Visages, villages. Rostos, vilarejos. O projeto é uma parceria do fotógrafo JR e da cineasta Agnès Varda, ícone do cinema francês, com 90 anos de idade. O filme estreia nesta quinta-feira (25) em Belo Horizonte, depois de ter recebido, na terça, uma indicação ao Oscar de melhor documentário. Juntos, Varda e JR põem o pé na estrada a bordo do caminhão fotográfico de JR. O veículo, em si, já é digno de atenção. Uma moderna caminhonete, em formato de máquina fotográfica, com todos os recursos a bordo para desenvolver sua arte.

Mas fora de série mesmo é a dupla de aventureiros. Ela, uma senhora muito bem disposta, falante e aberta ao diálogo com todos e todas, cabelo pintado em duas cores. Ele, sempre de chapéu e óculos escuros, lépido, desbocado e um ar permanente de Jean-Luc Godard. Aliás, Godard, o próprio, terá papel importante no enlace do filme, aquele momento mágico em que a obra dá volta sobre si mesma. Mas esse desfecho fica à espera do espectador.

 

 

No início, a dupla sai pela campanha francesa em busca de pequenas cidades e seus habitantes. Cidadezinhas comuns, gente comum. Que, vistas de perto, revelam-se incomuns, originais, únicas. São dessas pessoas e lugares que Agnès Varda gosta, como sabe quem conhece seus outros documentários, em particular sua obra-prima Os catadores e eu (Les glanêurs et la glaneuse).

Varda usa o cinema como diário e memória (veja-se, por exemplo As praias de Agnès, sua autobiografia fílmica). Mas não apenas. O cinema também a serve como instrumento de descoberta do outro. Nesse trajeto, de simples camponeses ao dono de fazenda, que, com a automação da agricultura, se tornou um homem solitário. Ou estivadores de um porto da Normandia e suas muito bem resolvidas mulheres.

Não se trata apenas de entrevistas. As pessoas são chamadas para se transformar em obras de arte. São fotografadas, e as cópias em tamanho gigante são estampadas num celeiro, na fachada de uma casa, num contêiner, numa esquina. Alteram a paisagem. Talvez mudem um pouco a maneira como essas pessoas veem a si mesmas.

Em todo caso, é nosso olhar que se transfigura com a passagem do filme. Já se disse que o cinema, quando grande, nos faz ver algo antes invisível. Algo que está diante de nós, mas não compreendemos. Deixando-se levar pelas coisas, “o acaso é meu melhor roteirista”, Varda e seus personagens enriquecem nosso olhar e sensibilidade. (Agência Estado)

OSCAR O Oscar completa em 2018 seus 90 anos. Pois a cineasta francesa Agnès Varda está quase lá – alcança 90 em 30 de maio. Com a indicação de Visages, villages ao Oscar de melhor documentário, ela se tornou a candidata mais velha a concorrer ao prêmio da Academia de Hollywood.

E esta foi sua primeira indicação, vale dizer. Se o filme bater os demais concorrentes – Últimos homens em Aleppo (sobre a guerra na Síria), Strong island (história que investiga um violento assassinato), Ícaro (sobre doping no esporte) e Abacus: Small enough to jail (sobre a crise financeira de 2008) – a estatueta fará par com outra.

Em novembro, Varda recebeu um Oscar honorário pelo imenso trabalho desenvolvido ao longo de seis décadas de atividade. Angelina Jolie, quando foi anunciar o prêmio, referiu-se a Varda como “a avó da Nouvelle Vague”.

Em entrevista ao site Vulture logo após saber da indicação ao Oscar, na terça (23), a cineasta se saiu com esta: “Nenhum dos meus filmes ganhou dinheiro (ela dirigiu pelo menos 50). Mas eu tenho muitos prêmios. Não sei se é uma compensação – o dinheiro não estava lá. Mas prêmios? Eu tenho um armário cheio.”

Visages, Villages será seu último documentário. “Queríamos fazer um filme para fazer o público adorar as pessoas que filmamos. Queríamos compartilhar a empatia que tivemos por eles. E queríamos compartilhar o desejo de compartilhar. Não há política em jogo. É apenas conhecer gente, compartilhar quem somos.”

A despeito disso, vai continuar na ativa. Atualmente, filma suas palestras, para que não precise se locomover tanto. Sobre a idade, e a demora em ser reconhecida pela Academia, Varda também não perdeu a fleuma. “Filmei Manoel de Oliveira, o diretor português. Ele tinha 102 anos quando o filmei. Então, vamos esquecer a idade. Nós somos velhos, mas ainda estamos vivos.”

 

Abaixo, confira o trailer de Visages, villages

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