O diretor mexicano Guillermo del Toro, que recebeu o maior número de indicações para o Globo de Ouro deste ano (sete) com o longa A forma da água, previsto para estrear no Brasil no dia 1º de fevereiro, diz que o mundo fantástico de seus filmes foi construído em seus primeiros 11 anos de vida.
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E o destino permitiu que ele representasse tudo isso no cinema.
“Tenho 52 anos, peso 110 quilos e fiz mais de 10 filmes”, disse, ao ganhar o Leão de Ouro em Veneza por seu longa. No domingo passado, quando recebeu o Globo de Ouro de melhor diretor – derrotando Martin McDonagh (Três anúncios para um crime), Christopher Nolan (Dunkirk), Ridley Scott (Todo o dinheiro do mundo) e Steven Spielberg (The Post) – ele disse: “Fui salvo pelos monstros, que são os santos das nossas imperfeições. Durante 25 anos, criei contos muito esquisitos. Muitas dessas histórias salvaram a minha vida.”
Enquanto agradecia os que o ajudaram a chegar até ali, Del Toro foi interrompido pela organização da cerimônia promovida pela Associação de Correspondentes Estrangeiros em Hollywood, que aumentou o volume da música ambiente, indicando que ele deveria deixar o palco. “Abaixem a música. Levou 25 anos para eu chegar aqui. Me deem mais um minutinho”, pediu.
Na sequência, o filme recebeu nada menos do que 12 indicações ao Bafta, a versão britânica do Oscar. A forma da água é apontado pela crítica especializada também como provável candidato em várias categorias do Oscar, cujas indicações serão divulgadas no próximo dia 23.
De acordo com Del Toro, que já completou 53 anos, esse é “seu primeiro filme adulto”. Estrelado por Sally Hawkins (indicada ao Globo de Ouro de melhor atriz), o longa-metragem é otimista, com a história de amor entre a zeladora de um laboratório ultrassecreto do governo dos Estados Unidos e uma criatura anfíbia, de origem amazônica, presa em um tanque de água.
“É sua obra-prima até agora”, diz Leonardo García-Tsao, crítico de cinema mexicano e um velho amigo de “El gordo”, como Del Toro é chamado em seu país. “Faltava (em sua filmografia) um elemento muito próprio de Guillermo, que é o humor”, observa.
O labirinto do fauno e A espinha do Diabo foram obras mais sombrias, explorando temas como a perda e a nostalgia. Embora algo permaneça intacto: a distinção entre as criaturas e os monstros.
As primeiras são retratas “com empatia”, e as segundas respondem sempre a um ser humano, “que acaba sendo o verdadeiro monstro”, afirma o próprio cineasta.
CATOLICISMO Del Toro cresceu em uma família muito católica. Sua mãe era uma poeta amadora que jogava tarô. E seu pai, um homem de negócios que ganhou na loteria e montou um império de concessionárias de automóveis.
Nascido em 9 de outubro de 1964, o diretor cresceu em uma mansão junto a serpentes, um corvo e ratos brancos, com os quais, às vezes, dormia abraçado, segundo publicou a revista The New Yorker.
“Tudo o que sou, no sentido da compulsão artística e das histórias que conto, vem dos meus primeiros 11 anos”, disse ele à revista Gatopardo. “Acredito que quem somos na essência se forma nesses primeiros anos. Depois passamos a vida remendando o que se rompeu e construindo o que não.”
Sua avó foi uma de suas grandes influências. “Não sei o que diria Freud, mas foi importantíssima”, disse ele. Não por acaso, a relação entre crianças e idosos é muito presente em sua obra. É vista, por exemplo, no filme Cronos (1993), que conta a história de um atípico vampiro idoso que não quer a vida eterna e de sua neta que o esconde em um baú. Esse foi o único filme que ele dirigiu no México.
O sequestro de seu pai o obrigou a sair do país em 1998, e dois anos “traumáticos” depois iniciou “a etapa espanhola”, na qual o tema da Guerra Civil foi uma constante. Tanto O labirinto do fauno quanto A espinha do Diabo foram filmados na Espanha, com total liberdade criativa.
Sua primeira experiência em Hollywood foi Mutação (1997), na qual, segundo contou, viveu um inferno enfrentando as intromissões e pressões dos produtores. Hoje um nome consagrado, Guillermo Del Toro faz cinema “com sua própria assinatura”, conforme diz o professor universitário e ex-membro do comitê latino no Sindicato de Diretores. “É um verdadeiro artista”.
Requisitado para diversos projetos, já se recusou, por exemplo, a dirigir Harry Potter e o primeiro título da saga Thor. Ele faz parte do prestigioso grupo “Los tres amigos”, junto aos também consagrados diretores mexicanos Alejandro González Iñárritu e Alfonso Cuarón.
“Têm estilos muito diferentes, mas Guillermo é o único que construiu um mundo muito reconhecível. É o único que permaneceu em um gênero”, avalia García-Tsao, que também presidiu a Cineteca Nacional de Mexico e não hesita em chamá-lo de “gênio”.
Além disso, considera o diretor “encantador, um cara muito generoso, muito amável”, um amigo com quem tinha “um código para fazer piadas sujas” e com quem fez mais de uma vez “um safári gastronômico” em Guadalajara. “É bom de garfo!”, acrescentou. (AFP)
Filmografia
Confira alguns títulos da carreira do diretor
» Cronos (1993)
» Mutação (1997)
» A espinha do Diabo (2001)
» Hellboy (2004)
» O labirinto do fauno (2006)
» Círculo de fogo (2008)