O documentário Human flow - Não existe lar se não existe para onde ir, do artista chinês dissidente Ai Weiwei (pronuncia-se ueiuei), que estreia nesta quinta (16) nos cinemas, aborda uma das mais viscerais questões da atualidade – a tragédia dos refugiados. Mas Weiwei não vê seu filme dessa maneira. “Para mim, a questão é muito mais vasta. O que temos de discutir é uma muito mais abrangente, a própria sobrevivência do planeta. Ignorar os refugiados, o direito de ir e vir, ignorar toda a agressão ao meio ambiente – tudo está conectado e configura a crise imensa que vivemos”, diz.
Weiwei esteve em São Paulo para ser homenageado e acompanhar a exibição de seu filme na 41ª Mostra de São Paulo (19/10 a 1º/11), cujo cartaz é assinado por ele. Antes disso, Human flow (Fluxo humano, em tradução livre do inglês) havia sido exibido no 74º Festival de Veneza (30/8 a 9/9)
saiba mais
Comboio de sal e açúcar, do brasileiro Licínio Azevedo, é premiado em Festival de Cartago
'O legado de 2013 é um enigma', diz João Moreira Salles em entrevista ao EM
Cine Humberto Mauro recebe mostra dedicada a William Wyler
Em seus 120 anos, BH já foi cenário, personagem e musa de filmes; conheça algumas dessas histórias
Decisão de uma mãe sobre o futuro da gravidez é tema central do longa Invisível
Ai Weiwei já havia abordado a crise dos refugiados em seu trabalho, quando “envolveu” a casa de concertos Konzerthaus de Berlim, cidade em que vive atualmente, com milhares de coletes salva-vidas laranjas recolhidos em Lesbos e também quando usou seu próprio corpo para recriar a imagem do menino sírio Aylan Kurdi, que morreu afogado enquanto seus pais tentavam a travessia no mar e cujo corpo na areia registrado por um fotógrafo se tornou a cena emblemática da crise migratória.
“Tentei desesperadamente dar um grito, ser ouvido”, afirma, ao explicar os trabalhos, “mas entendi que não era suficiente”. Por esse motivo, decidiu dirigir o filme, que envolveu, com a ideia, segundo ele, de falar tudo o que aprendeu e “mostrar a outras pessoas”. O artista, que permaneceu em prisão domiciliar durante três meses na China em 2011 já havia produzido vários documentários, mas esta é a primeira vez que apresenta um filme tão ambicioso, que teve uma equipe de 200 pessoas.
Viagem Em Human flow, Ai Weiwei faz uma longa viagem, que o leva até a ilha grega de Lesbos, principal porta de entrada dos migrantes na Europa entre 2015 e 2016. Também visita o imenso campo de refugiados de Dadaab, no Quênia, passa pelos bairros pobres de Gaza, a fronteira entre o Afeganistão e o Paquistão e os campos de batalha do Iraque, antes de terminar entre o México e Estados Unidos, onde o presidente americano Donald Trump prometeu construir um “bonito muro”. Confira o trailer:
A respeito de líderes mundiais como Trump, o artista afirma: “O grande problema é o excesso de poder conferido a essas pessoas. Se cada um tivesse mais noção de sua pequenez no universo as coisas seriam diferentes”.
Weiwei não consegue se ver como um cineasta. “Sou um pouco mais que isso. Faço muita coisa, você sabe. Muita coisa visual, um tanto de comunicação verbal e tudo isso ligado a uma preocupação crítica com a mídia social.” Sobre as imagens de seu documentário, Weiwei imprime muita coisa escrita – dados estatísticos, poemas. “É uma tradição da arte chinesa. Você encontra muita coisa escrita com as imagens”. Num conjunto algo discutível, as mais belas imagens do longa são tomadas aéreas com drones. “Queria esse ângulo do pássaro voando. A pobre humanidade vista do alto.”
*O filme está em cartaz no Cine Belas Artes, Sala 2, às 14h e às 21h.