São Paulo – Em seu novo filme, Mãe!, Darren Aronofsky só deixa dois caminhos para o espectador: você embarca ou não na história. Não há meio-termo. “Eu sabia que era um filme muito agressivo, intenso, que dividiria o público. Acho que as pessoas que embarcam nele o fazem de uma maneira nunca vista antes em minha obra. Talvez, a partir deste trabalho, eu tenha que ir para um caminho mais agressivo para me sentir plenamente realizado.”
Mãe! estreia hoje no Brasil depois de muito auê nas últimas semanas – dividiu as plateias dos festivais de Veneza (onde foi igualmente aplaudido e vaiado) e Toronto – já foi chamado de confuso, ultrajante e pretensioso. Mas também de provocador, brilhante e ousado. Tais adjetivos são válidos, dependendo do ponto de vista. Mas dificilmente você irá ouvir um adjetivo como monótono ou tedioso sobre a produção.
A sinopse oficial apresenta o filme como uma história de um casal cujo relacionamento é posto à prova quando um outro casal, sem ser convidado, chega à sua casa. Isso é só o ponto de partida. Repleto de alegorias, Mãe! pode ter uma leitura ambiental, política ou religiosa. E a meia hora final é a responsável pelas reações extremadas. É um filme definitivamente não indicado para gostos convencionais.
Aronofsky, de 48 anos, veio ao Brasil para apresentar o filme. Uma produção de estúdio (a Paramount), com um elenco estelar (Jennifer Lawrence, atualmente namorando o diretor, Javier Bardem, Michelle Pfeiffer e Ed Harris) e um orçamento relativamente baixo para os padrões hollywoodianos (US$ 30 milhões). É ainda o primeiro longa dirigido por ele desde o blockbuster Noé (2014), um desvario que colocava a narrativa do Gênesis em meio a seres alienígenas.
AMBIÇÃO “Fazer cinema é fazer cinema, não importa o orçamento. Se US$ 20 milhões ou US$ 100 milhões, sempre vai ter gente para dar dinheiro. E sempre vai ter gente nervosa com isso. Minha equipe e eu sempre trabalhamos com um orçamento limitado e buscamos ser o mais ambicioso possível com o que temos”, disse ele.
Os personagens não têm nome. Lawrence é a mãe, casada com o escritor interpretado por Bardem (Ele, grafado com maiúsculas). O casal está vivendo, há pouco, numa casa imensa e isolada. A mãe foi responsável por toda a reforma, enquanto Ele está em crise criativa. Até que em uma noite, um homem (Harris) bate à porta do casal. Rapidamente, e a despeito das negativas da mãe, ele cai nas graças do escritor. No dia seguinte, a mulher (Pfeiffer) chega para se encontrar com o marido. Impávida com a invasão, a mãe não consegue fazer o marido desistir dos intrusos.
A primeira versão do roteiro de Mãe! foi escrita por Aronofsky em cinco dias. “Faço cinema há 20 anos, então queria mudar minha forma de trabalhar. Eu me inspirei muito em compositores que levam um só dia para fazer uma música. O cinema leva muito tempo. Minha intenção era tentar seguir uma única emoção para contar uma história”, disse.
É a questão ambiental o mote dessa história. “É uma questão global, vemos o que está acontecendo no mundo todo, com incêndios em todo lugar. Minha ideia era personificar esta questão para que ela ficasse compreensível.” A personagem de Lawrence seria a mãe natureza; o de Bardem, Deus. A casa seria o planeta Terra. Adão e Eva, Caim e Abel também são facilmente reconhecíveis na narrativa.
“A Bíblia fala sobre ter o domínio do planeta. No Gênesis 2:15 é dito que temos que cuidar dele (“O Senhor Deus colocou o homem no jardim do Éden para cuidar dele e cultivá-lo”). Então, sempre houve esse debate, e hoje até o papa Francisco fala sobre isso. Ou seja, este cuidado está nos ensinamentos, só que isso foi mal interpretado pelo homem.”
A despeito dos tons trágicos da narrativa, Aronofsky se diz um otimista. “É através da tragédia, dos lugares escuros, que a luz se revela. Acho que não estamos na última etapa da nossa relação com a natureza. Ainda há tempo de mudar.”
Mãe! é um filme que se conecta com a filmografia anterior do diretor de maneiras diversas. É angustiante como Réquiem para um sonho (2000), discute a relação do homem com Deus, como em Fonte da vida (2006), e traz o mesmo tom de suspense psicológico de Cisne negro (2010). Mas é uma produção que não se encaixa em nenhum padrão.
“Sempre tento ajudar com a venda de um filme meu. Mas este é dificílimo de vender, pois não é um filme de gênero. Não é terror, ainda que você saia fodido dele. A verdade é que nunca faço um filme que se encaixa totalmente num modelo. A única coisa mais ‘normal’ é a presença de Jennifer Lawrence, Michelle Pfeiffer, Javier Bardem e Ed Harris. Talvez se fosse um filme com atores menos famosos... Acho que o público quer também ver coisas diferentes.”
Lawrence abandonou o projeto da comédia romântica The Rosie project para participar do filme de Aronofsky. Sua personagem está o tempo inteiro em cena. Com a câmera praticamente grudada nela, acompanhamos as mudanças da mãe frente à invasão do mundo que ela, literalmente, construiu. A câmera explora rosto e corpo da atriz para mostrar a violência que vai sofrendo, seja em sua condição de mulher ou de mãe.
“Jennifer logo percebeu que o filme era algo bem diferente e importante para ela. Tecnicamente, foi meu maior desafio. Foi uma filmagem difícil, Jennifer tinha que estar aterrada naquele caos, vendo seu mundo ruir de forma cada vez mais insana”, conta Aronofsky. Os fãs da heroína de Jogos vorazes Katniss Everdeen ainda não atenderam ao chamado da atriz. Nos Estados Unidos, Mãe! arrecadou em sua primeira semana US$ 7,5 milhões, a pior estreia de um filme protagonizado pela atriz.
>> OBSESSÃO CINEMATOGRÁFICA
Confira a filmografia de Darren Aronofsky
Pi (1998)
Espiral de aflições de um homem obsessivo que tenta descobrir um padrão matemático supremo. Ele é ainda atormentado por enxaquecas intensas que destroem seu cérebro aos poucos. O longa de estreia só foi lançado no Brasil quatro anos depois, na esteira da repercussão de seu segundo filme, Réquim para um sonho.
Réquiem para um sonho (2000)
Produção que colocou Aronofsky entre os grandes, é um pesadelo sobre o vício em drogas. No caso, a heroína. No elenco, a veterana Ellen Byrsten foi indicada ao Oscar. Tem um grande momento, assim como Jared Leto e Jennifer Connelly.
Fonte da vida (2006)
Filme que, a exemplo de Mãe!, despertou amores e ódios. Três histórias em tempos distintos com os mesmos atores (Hugh Jackman e Rachel Weisz). Um cientista que busca a cura do câncer para salvar a mulher, que está morrendo de tumor cerebral; um conquistador que viaja para o Novo Mundo em busca da árvore da vida e um cientista que viaja pelo espaço.
O lutador (2008)
O diretor tira Mickey Rourke do limbo para interpretar um lutador de boxe que, assim como o ator, amarga uma decadência física e na carreira. O filme recebeu duas indicações ao Oscar. Melhor ator para Rourke e atriz coadjuvante para Marisa Tomei.
Cisne negro (2010)
A consagração de Aronofsky deu ainda o primeiro Oscar de melhor atriz a Natalie Portman (foto). A história mostra as obsessões de uma jovem bailarina, capaz de ultrapassar todos os seus limites para se tornar a estrela de uma prestigiosa companhia de balé.
Noé (2014)
Com um orçamento polpudo – US$ 125 milhões, o maior de sua carreira – o diretor constrói um épico sobre a história de Noé (aqui interpretado por Russell Crowe) e sua arca. Com alienígenas misturados a citações bíblicas, o filme teve uma bilheteria mundial da ordem de US$ 362 milhões.
Mãe! estreia hoje no Brasil depois de muito auê nas últimas semanas – dividiu as plateias dos festivais de Veneza (onde foi igualmente aplaudido e vaiado) e Toronto – já foi chamado de confuso, ultrajante e pretensioso. Mas também de provocador, brilhante e ousado. Tais adjetivos são válidos, dependendo do ponto de vista. Mas dificilmente você irá ouvir um adjetivo como monótono ou tedioso sobre a produção.
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Aronofsky, de 48 anos, veio ao Brasil para apresentar o filme. Uma produção de estúdio (a Paramount), com um elenco estelar (Jennifer Lawrence, atualmente namorando o diretor, Javier Bardem, Michelle Pfeiffer e Ed Harris) e um orçamento relativamente baixo para os padrões hollywoodianos (US$ 30 milhões). É ainda o primeiro longa dirigido por ele desde o blockbuster Noé (2014), um desvario que colocava a narrativa do Gênesis em meio a seres alienígenas.
AMBIÇÃO “Fazer cinema é fazer cinema, não importa o orçamento. Se US$ 20 milhões ou US$ 100 milhões, sempre vai ter gente para dar dinheiro. E sempre vai ter gente nervosa com isso. Minha equipe e eu sempre trabalhamos com um orçamento limitado e buscamos ser o mais ambicioso possível com o que temos”, disse ele.
Os personagens não têm nome. Lawrence é a mãe, casada com o escritor interpretado por Bardem (Ele, grafado com maiúsculas). O casal está vivendo, há pouco, numa casa imensa e isolada. A mãe foi responsável por toda a reforma, enquanto Ele está em crise criativa. Até que em uma noite, um homem (Harris) bate à porta do casal. Rapidamente, e a despeito das negativas da mãe, ele cai nas graças do escritor. No dia seguinte, a mulher (Pfeiffer) chega para se encontrar com o marido. Impávida com a invasão, a mãe não consegue fazer o marido desistir dos intrusos.
A primeira versão do roteiro de Mãe! foi escrita por Aronofsky em cinco dias. “Faço cinema há 20 anos, então queria mudar minha forma de trabalhar. Eu me inspirei muito em compositores que levam um só dia para fazer uma música. O cinema leva muito tempo. Minha intenção era tentar seguir uma única emoção para contar uma história”, disse.
É a questão ambiental o mote dessa história. “É uma questão global, vemos o que está acontecendo no mundo todo, com incêndios em todo lugar. Minha ideia era personificar esta questão para que ela ficasse compreensível.” A personagem de Lawrence seria a mãe natureza; o de Bardem, Deus. A casa seria o planeta Terra. Adão e Eva, Caim e Abel também são facilmente reconhecíveis na narrativa.
“A Bíblia fala sobre ter o domínio do planeta. No Gênesis 2:15 é dito que temos que cuidar dele (“O Senhor Deus colocou o homem no jardim do Éden para cuidar dele e cultivá-lo”). Então, sempre houve esse debate, e hoje até o papa Francisco fala sobre isso. Ou seja, este cuidado está nos ensinamentos, só que isso foi mal interpretado pelo homem.”
A despeito dos tons trágicos da narrativa, Aronofsky se diz um otimista. “É através da tragédia, dos lugares escuros, que a luz se revela. Acho que não estamos na última etapa da nossa relação com a natureza. Ainda há tempo de mudar.”
Mãe! é um filme que se conecta com a filmografia anterior do diretor de maneiras diversas. É angustiante como Réquiem para um sonho (2000), discute a relação do homem com Deus, como em Fonte da vida (2006), e traz o mesmo tom de suspense psicológico de Cisne negro (2010). Mas é uma produção que não se encaixa em nenhum padrão.
“Sempre tento ajudar com a venda de um filme meu. Mas este é dificílimo de vender, pois não é um filme de gênero. Não é terror, ainda que você saia fodido dele. A verdade é que nunca faço um filme que se encaixa totalmente num modelo. A única coisa mais ‘normal’ é a presença de Jennifer Lawrence, Michelle Pfeiffer, Javier Bardem e Ed Harris. Talvez se fosse um filme com atores menos famosos... Acho que o público quer também ver coisas diferentes.”
Lawrence abandonou o projeto da comédia romântica The Rosie project para participar do filme de Aronofsky. Sua personagem está o tempo inteiro em cena. Com a câmera praticamente grudada nela, acompanhamos as mudanças da mãe frente à invasão do mundo que ela, literalmente, construiu. A câmera explora rosto e corpo da atriz para mostrar a violência que vai sofrendo, seja em sua condição de mulher ou de mãe.
“Jennifer logo percebeu que o filme era algo bem diferente e importante para ela. Tecnicamente, foi meu maior desafio. Foi uma filmagem difícil, Jennifer tinha que estar aterrada naquele caos, vendo seu mundo ruir de forma cada vez mais insana”, conta Aronofsky. Os fãs da heroína de Jogos vorazes Katniss Everdeen ainda não atenderam ao chamado da atriz. Nos Estados Unidos, Mãe! arrecadou em sua primeira semana US$ 7,5 milhões, a pior estreia de um filme protagonizado pela atriz.
A repórter viajou a convite da Paramount
>> OBSESSÃO CINEMATOGRÁFICA
Confira a filmografia de Darren Aronofsky
Pi (1998)
Espiral de aflições de um homem obsessivo que tenta descobrir um padrão matemático supremo. Ele é ainda atormentado por enxaquecas intensas que destroem seu cérebro aos poucos. O longa de estreia só foi lançado no Brasil quatro anos depois, na esteira da repercussão de seu segundo filme, Réquim para um sonho.
Réquiem para um sonho (2000)
Produção que colocou Aronofsky entre os grandes, é um pesadelo sobre o vício em drogas. No caso, a heroína. No elenco, a veterana Ellen Byrsten foi indicada ao Oscar. Tem um grande momento, assim como Jared Leto e Jennifer Connelly.
Fonte da vida (2006)
Filme que, a exemplo de Mãe!, despertou amores e ódios. Três histórias em tempos distintos com os mesmos atores (Hugh Jackman e Rachel Weisz). Um cientista que busca a cura do câncer para salvar a mulher, que está morrendo de tumor cerebral; um conquistador que viaja para o Novo Mundo em busca da árvore da vida e um cientista que viaja pelo espaço.
O lutador (2008)
O diretor tira Mickey Rourke do limbo para interpretar um lutador de boxe que, assim como o ator, amarga uma decadência física e na carreira. O filme recebeu duas indicações ao Oscar. Melhor ator para Rourke e atriz coadjuvante para Marisa Tomei.
Cisne negro (2010)
A consagração de Aronofsky deu ainda o primeiro Oscar de melhor atriz a Natalie Portman (foto). A história mostra as obsessões de uma jovem bailarina, capaz de ultrapassar todos os seus limites para se tornar a estrela de uma prestigiosa companhia de balé.
Noé (2014)
Com um orçamento polpudo – US$ 125 milhões, o maior de sua carreira – o diretor constrói um épico sobre a história de Noé (aqui interpretado por Russell Crowe) e sua arca. Com alienígenas misturados a citações bíblicas, o filme teve uma bilheteria mundial da ordem de US$ 362 milhões.