Mais longevo festival de cinema do país, Brasília dá início, nesta sexta-feira, à sua edição de número 50. Também o mais politizado evento do gênero, ele vem se pautando pela diversidade. Na mostra competitiva de longas, a mais importante, serão exibidas nove produções de nove estados. Questões de gênero e de raça, bem como a situação sociopolítico brasileira, estão em pauta.
Hoje, na abertura oficial, haverá homenagem a Nelson Pereira dos Santos, com a exibição do curta Nelson filma (1971), de Luiz Carlos Lacerda. A competitiva terá início amanhã. Minas Gerais, que levou o principal Candango na edição passada (com A cidade onde envelheço, de Marília Rocha), disputa com dois filmes.
O curta Nada, de Gabriel Martins, será exibido amanhã. Lançado na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes, em maio, o filme da produtora Filmes de Plástico, de Contagem, concorre com 11 curtas. A partir da imagem de uma garota, Bia, respondendo “nada” ao ser perguntada sobre sua opção no vestibular, o diretor criou uma história para “tentar entender essa escolha”.
Quando concebeu a personagem, Martins pensou logo de cara na rapper Clara Lima, que só conhecia de assistir ao Duelo de MCs, em BH. “Os duelos buscam a atitude de um afrontar o outro. Você tem que ser firme, pois as ofensas são duras. Achei que seria interessante para a Bia”, conta ele. Nada foi rodado em Contagem (nas casas dos pais e dos tios de Martins), como também no Colégio Padre Eustáquio, onde o diretor estudou.
Sócio da Filmes de Plástico, Martins está na ficha técnica de um longa que concorre em Brasília. O nó do diabo, produção paraibana que será exibida no dia 20, tem cinco episódios dirigidos por cinco realizadores. São cinco contos de horror ambientados numa fazenda. Martins dirige o segundo, 1987.
Em 23 de setembro, último dia das competitivas, será exibido Arábia. Dirigido por Affonso Uchoa e João Dumans (diretor e roteirista, respectivamente, de A vizinhança do tigre, 2014), o longa terá em Brasília sua primeira exibição pública no país. A première foi em fevereiro, no Festival de Roterdã, na Holanda.
Arábia participou de pelo menos 15 eventos internacionais. “O filme vem tendo ressonância muito forte na América Latina por causa do tema”, comenta Dumans. O longa, cujo título foi tirado de um conto de Dublinenses, livro de James Joyce, mostra uma década na vida de um trabalhador brasileiro. Aristides de Souza (que participou de A vizinhança do tigre) é Cristiano, homem de Contagem (cidade de Uchoa), que, mudando de emprego, vai parar em Ouro Preto, onde Dumans nasceu.
A narrativa tem início na cidade histórica mineira. Operário de uma fábrica de alumínio, Cristiano sofre um acidente. Um garoto encontra o caderno do trabalhador, em que ele explica como chegou até ali. A partir daí, a narrativa é apresentada em flashback.
“O personagem é trabalhador de trecho (braçal), que passa de uma cidade para a outra. É um solitário, e vai encontrando pessoas ao longo do caminho. Arábia carrega o espírito do filme de estrada”, diz Dumans. Houve locações em Ouro Preto (na chamada Vila Operária), Brumadinho, Caeté, Mariana, Contagem e BH. Mas outras cidades mineiras aparecem caracterizadas na história, como Ipatinga, Teófilo Otoni e Governador Valadares.
DESUNIÃO “Nunca quis fazer cinema social, realista, de denúncia. Mas este é um filme político, sobre problemas sociais, com um olhar artístico. A questão é o estado atual da classe trabalhadora, de desunião, sem laços. Ainda mais neste mundo em que o trabalho parece ter menos importância”, diz Uchoa.
O cineasta comenta que o personagem Cristiano reúne duas características. “Ele traz o cruzamento da vida de um trabalhador com a literatura. Pessoas comuns, anônimas, que passam pela vida sem deixar rastros como os grandes heróis, também podem ser objeto da literatura”, conclui.
Jovens e veteranos
A seleção do festival reúne cineastas iniciantes e diretores mais experientes. “Prata da casa”, Adirley Queirós, de Ceilândia, participa novamente do evento com Era uma vez Brasília. Daniela Thomas, representante de São Paulo, vai concorrer com Vazante, sobre o senhor de escravos que se casa com uma menina de 12 anos. Heloísa Passos, do Paraná, exibirá Construindo pontes, drama doméstico que examina a ditadura militar. A carioca Júlia Murat compete com Pendular, sobre o amor de uma bailarina por um artista plástico. A lista é completada pelo gaúcho Música para quando as luzes se apagam, de Ismael Cannepele; o pernambucano Por trás da linha de escudos, de Marcelo Pedroso; e o baiano Café com canela, de Ary Rosa e Glenda Nicácio.
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O curta Nada, de Gabriel Martins, será exibido amanhã. Lançado na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes, em maio, o filme da produtora Filmes de Plástico, de Contagem, concorre com 11 curtas. A partir da imagem de uma garota, Bia, respondendo “nada” ao ser perguntada sobre sua opção no vestibular, o diretor criou uma história para “tentar entender essa escolha”.
Quando concebeu a personagem, Martins pensou logo de cara na rapper Clara Lima, que só conhecia de assistir ao Duelo de MCs, em BH. “Os duelos buscam a atitude de um afrontar o outro. Você tem que ser firme, pois as ofensas são duras. Achei que seria interessante para a Bia”, conta ele. Nada foi rodado em Contagem (nas casas dos pais e dos tios de Martins), como também no Colégio Padre Eustáquio, onde o diretor estudou.
Sócio da Filmes de Plástico, Martins está na ficha técnica de um longa que concorre em Brasília. O nó do diabo, produção paraibana que será exibida no dia 20, tem cinco episódios dirigidos por cinco realizadores. São cinco contos de horror ambientados numa fazenda. Martins dirige o segundo, 1987.
Em 23 de setembro, último dia das competitivas, será exibido Arábia. Dirigido por Affonso Uchoa e João Dumans (diretor e roteirista, respectivamente, de A vizinhança do tigre, 2014), o longa terá em Brasília sua primeira exibição pública no país. A première foi em fevereiro, no Festival de Roterdã, na Holanda.
Arábia participou de pelo menos 15 eventos internacionais. “O filme vem tendo ressonância muito forte na América Latina por causa do tema”, comenta Dumans. O longa, cujo título foi tirado de um conto de Dublinenses, livro de James Joyce, mostra uma década na vida de um trabalhador brasileiro. Aristides de Souza (que participou de A vizinhança do tigre) é Cristiano, homem de Contagem (cidade de Uchoa), que, mudando de emprego, vai parar em Ouro Preto, onde Dumans nasceu.
A narrativa tem início na cidade histórica mineira. Operário de uma fábrica de alumínio, Cristiano sofre um acidente. Um garoto encontra o caderno do trabalhador, em que ele explica como chegou até ali. A partir daí, a narrativa é apresentada em flashback.
“O personagem é trabalhador de trecho (braçal), que passa de uma cidade para a outra. É um solitário, e vai encontrando pessoas ao longo do caminho. Arábia carrega o espírito do filme de estrada”, diz Dumans. Houve locações em Ouro Preto (na chamada Vila Operária), Brumadinho, Caeté, Mariana, Contagem e BH. Mas outras cidades mineiras aparecem caracterizadas na história, como Ipatinga, Teófilo Otoni e Governador Valadares.
DESUNIÃO “Nunca quis fazer cinema social, realista, de denúncia. Mas este é um filme político, sobre problemas sociais, com um olhar artístico. A questão é o estado atual da classe trabalhadora, de desunião, sem laços. Ainda mais neste mundo em que o trabalho parece ter menos importância”, diz Uchoa.
O cineasta comenta que o personagem Cristiano reúne duas características. “Ele traz o cruzamento da vida de um trabalhador com a literatura. Pessoas comuns, anônimas, que passam pela vida sem deixar rastros como os grandes heróis, também podem ser objeto da literatura”, conclui.
Jovens e veteranos
A seleção do festival reúne cineastas iniciantes e diretores mais experientes. “Prata da casa”, Adirley Queirós, de Ceilândia, participa novamente do evento com Era uma vez Brasília. Daniela Thomas, representante de São Paulo, vai concorrer com Vazante, sobre o senhor de escravos que se casa com uma menina de 12 anos. Heloísa Passos, do Paraná, exibirá Construindo pontes, drama doméstico que examina a ditadura militar. A carioca Júlia Murat compete com Pendular, sobre o amor de uma bailarina por um artista plástico. A lista é completada pelo gaúcho Música para quando as luzes se apagam, de Ismael Cannepele; o pernambucano Por trás da linha de escudos, de Marcelo Pedroso; e o baiano Café com canela, de Ary Rosa e Glenda Nicácio.