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Documentário sobre Antônio Pitanga chega hoje aos cinemas

Dirigido pela filha, Camila Pitanga, e Beto Brant, filme mostra a importância do ator que participou ativamente de momentos cruciais da história cultural do país

Ana Clara Brant

- Foto: FOTOS: MATHEUS BRANT/DIVULGAÇÃO

Pitanga, documentário que investiga o percurso estético, político e existencial do ator Antonio Pitanga, de 77 anos, e que estreia hoje em 17 cidades, inclusive Belo Horizonte, tem sua origem em outro longa-metragem, Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios (2012). No filme, com direção de Beto Brant e inspirado no livro homônimo do escritor Marçal Aquino, o artista baiano faz uma participação. Durante uma das viagens para lançar a produção, o diretor propôs a Camila Pitanga, atriz e filha de Antonio, de fazer algo sobre o pai dela, grande contador de histórias. A proposta foi, no mínimo, tentadora. “Fiquei superanimada, mas não entendi se era algo do momento, se era pra valer. Mas acabou que não era fogo de palha e o resultado está aí. A gente entrou de cabeça”, conta Camila, que estreia como diretora no documentário ao lado de Beto Brant.

O processo todo durou cerca de três anos e meio. Inicialmente, Camila fez uma espécie de pré-entrevista em sua casa para entender as forças e os rumos que o projeto tomaria. A trajetória no cinema, a verve política, a família, os amigos, e os afetos foram os temas mais presentes. “Essa conversa inicial foi fundamental para tentar definir com que tipo de personagem a gente ia dialogar. A partir daquele momento, o barco foi seguindo com muita fluidez
. Rodamos na Bahia, no Rio, em São Paulo e até na Argentina”, relata.


Ao mesmo tempo em que mostra a estrada pessoal e profissional percorrida por Pitanga, o documentário traz um pouco da história do próprio país nos últimos anos, sobretudo os eventos artísticos e culturais. O ator, nascido Antonio Sampaio, adotou o sobrenome Pitanga após o filme Bahia de todos os santos (1960), quando incorporou o nome do personagem que interpretou. No documentário, é grande a lista de personalidades que batem papo e dão depoimentos sobre a trajetória do ator: Caetano Veloso, Gilberto Gil, Joel Zito Araújo, Chico Buarque, Paulinho da Viola, Othon Bastos, Zé Celso Martinez Corrêa, Ziraldo, Zezé Motta, Cacá Diegues, Hugo Carvana e Neville D’Almeida, além da família, a começar pela mulher, Benedita da Silva, ex-governadora do Rio de Janeiro, mas ainda irmãos, sobrinhos, os filhos Camila e Rocco, e as netas Amanda, Bruna e Antonia.

Dono de impressionante carisma, no filme, o ator joga seu charme para algumas de suas amigas – Zezé Motta, Léa Garcia, Ittala Nandi e até Maria Bethânia, o que rende boas passagens. Para a cantora baiana ele revela: “Sabia que você foi minha primeira namorada?”. Bethânia dá um sorriso e devolve: “Só se for a primeira namorada em Salvador né, Pitanga?”.

Em janeiro, Camila e o pai estiveram em Tiradentes participando da Mostra de Cinema da cidade mineira. O documentário acabou levando o Prêmio do Público de melhor filme. Por uma feliz coincidência, na ocasião, Camila e a atriz e amiga Leandra Leal lançaram filmes relacionados à própria história. Leandra também estreou como diretora em Divinas divas, documentário sobre a primeira geração de travestis brasileiros que tiveram como reduto o Teatro Rival, no Rio, que pertence à família de Leandra. “Foi muito interessante estar em Tiradentes com a Leandra, porque apresentamos histórias muito próximas da gente, que tinham a ver com nossa formação e precisavam ser contadas. Mostramos um novo olhar, mas sem deixar de lado as nossas raízes

. Não só a minha e a dela, mas a nossa raiz brasileira. Mergulhamos na nossa história e convidamos o público a mergulhar junto com a gente”, destaca.

Mesmo convivendo com o pai desde que nasceu, Camila Pitanga diz ter se surpreendido com muitas informações reveladas durante as filmagens, sobretudo, o papel dele como artista. “Entendi mais claramente esse diálogo entre cinema e teatro que inaugurou um tipo de performance com o corpo mais livre. É interessante que, mesmo travestido de personagem, o meu pai não deixa de manifestar o seu pensamento e mostrar tudo que viveu nesses anos todos, já que participou de um período bastante representativo do cinema nacional. Pitanga nos leva a refletir sobre muitas coisas. Hoje, mais do que nunca, temos que repensar que projeto de país nos queremos”, salienta.

Camila, que tirou um ano sabático após a novela Velho Chico – seu último trabalho na TV –, deve voltar a encenar o espetáculo O duelo em algumas cidades ainda em 2017. No entanto, o foco é realmente o documentário sobre seu pai. “Pitanga não é apenas um projeto, mas é a minha escolha de semear e regar a minha família, o meu dia a dia, com a minha filha, com o meu pai. E o filme está chegando aí com muito tesão, muita alegria e entusiasmo”, avisa.


Três perguntas para..Antonio Pitanga


O que mais o encantou neste projeto?
Para mim, por incrível que pareça, tudo é novo. Surpreendi-me em ver esse projeto pronto e confesso que estou cada vez mais apaixonado por esse Pitanga (risos). É um filme que conta a história de uma família, e que fala de um cinema brasileiro que traz a questão da afirmação, dos direitos humanos, da mulher, da questão racial. Foi muito interessante e uma alegria enorme fazer essa revisitação não só da minha carreira, mas de um pedaço da própria história do Brasil.

As mulheres sempre tiveram um papel muito forte na sua vida. Você acha que ter sido criado sozinho por sua mãe e pela personalidade dela moldou o seu jeito de ser?
Sem dúvida que toda essa consciência e esse olhar que eu tenho sobre as coisas começou com a Maria da Natividade (sua mãe), uma mulher forte, que fez o que queria e tinha vontade e jamais baixou a cabeça para nada. Sempre fui rodeado por grandes mulheres e tenho cada vez mais aprendido com elas. Acho muito bacana o fato de a Camila ter me dirigido porque, além de ser minha filha, é mais uma mulher que entra nesse ramo da direção.

O que lhe dá mais orgulho em sua trajetória?

Acho que é ver o crescimento de um ator que já em Barravento (filme de Glauber Rocha, de 1962) mostra a que veio e o que queria. Não consigo me imaginar fazendo outra coisa. E olha que, quando estudei no colégio interno, aprendi todas as profissões que você possa imaginar. Tenho muito orgulho e paixão pelo meu trabalho e isso acabou se refletindo nos meus filhos, que também são atores. Quando vejo esse documentário, vejo um Pitanga menos brigão, mais respeitoso, com posições bem definidas, mais forte culturalmente. Espero que o Pitanga aqui não decepcione o Pitanga da tela (risos).

 

*Pitanga está em exibição no Cine Belas Artes (Rua Gonçalves Dias, 1581, Lourdes)

Belas Artes 2: 16h30, 19h

 

Veja o trailer: