A Ilha da Caveira, onde Kong reina, é uma espécie de Triângulo das Bermudas ao quadrado. Situa-se num ponto do Pacífico Sul rodeado por um “sistema perpétuo de tempestades”. É para lá que uma equipe de cientistas quer ir, com a intenção de provar a existência de monstros gigantescos, que seriam os “donos” por excelência do planeta, vivendo num ecossistema ainda fora do radar do conhecimento científico.
Estamos em 1973, no momento em que Richard Nixon determina a retirada das tropas americanas do Vietnã, para desconsolo do tenente-coronel Packard (Samuel L. Jackson). A equipe de cientistas – formada por um branco veterano de guerra, um negro e uma asiática, num caldeirão multiétnico que denota a preocupação do roteiro com a cartilha da correção política em vigor nos anos 2000 – consegue o aval do governo para sua expedição sob o argumento de que, se não for assim, os russos chegarão lá antes.
Packard e seu grupo de elite são os encarregados de fazer os cientistas atravessarem as terríveis tempestades (de helicóptero) e desembarcar (atirando) nos domínios de Kong. Há dois convidados a bordo – o ex-militar britânico James Conrad (Tom Hiddleston), contratado a peso de ouro por suas habilidades de rastreador na selva, e a fotógrafa “antiguerra” Mason Weaver (Brie Larson), que documentará a missão.
Se o espectador prestar atenção ao grandiloquente discurso de Packard enquanto os helicópteros sacolejam entre nuvens e raios, verá os primeiros indícios do comportamento que ele assumirá na ilha, o de um sujeito cego a tudo que não seja sua obsessão vingativa. Mas pode ser que a espetacular aparição de Kong deixe as impressões anteriores um pouco apagadas.
Os diálogos de Kong – A Ilha da Caveira alternam momentos de alívio cômico, sobretudo nas conversas entre os soldados, com outros de “mensagem”, como quando Conrad afirma que “nenhum homem volta da guerra”. O diretor Jordan Vogt-Roberts distribuiu doses de narrativa clássica (na apresentação subsequente dos personagens principais), registros documentais (em imagens de Nixon e Kennedy) e momentos descontraídos (Weaver fotografando os bastidores do início da operação) ao longo das cenas de perseguição e combate, que se sucedem em diferentes combinações – homens x monstros; monstros x monstros; homens x homens.
SURPRESAS A Ilha da Caveira reservará aos seus visitantes mais surpresas do que a descoberta de uma variedade de animais estranhos de proporções gigantescas. É nesse ponto que se revela a conexão da trama de 1973 com a cena inicial do filme, ambientada em 1944, num duelo entre um soldado americano e um japonês. O que oferece a chance de o roteiro salientar que os EUA estão sempre em guerra e fazer uma boa piada sobre a Guerra Fria, expressão que um dos personagens militares desconhece. “Quer dizer o quê? No verão não se combate?”.
Como se nota, Kong – A Ilha da Caveira tem pouco em comum com o filme de estreia do personagem King Kong no cinema, em 1933, em que o macaco gigante se encantava pela atriz loira que fora filmar num território exótico e terminava como atração de zoológico em Nova York
Em resumo, é um filme de monstros e ação com verbetes da cartilha politicamente correta (“diversidade” e “gênero”, sobretudo). Conta com um diretor competente e um time de estrelas no elenco, embora Brie Larson pareça nada à vontade nesse seu desembarque numa superprodução, após o sucesso de crítica – e o Oscar – conquistados com O quarto de Jack. Para gostar de Kong – A Ilha da Caveira é preciso se concentrar na ação e abstrair a mensagem, que soa artificial e militarmente calculada.
Confira o trailer: