Depois de ser coberto por uma avalanche de elogios e prêmios e se tornar o filme incontornável da temporada, La la land começa a conhecer o outro lado da fama – a crítica impiedosa. Por ser uma despudorada declaração de amor a Hollywood, o longa vem sendo apontado por alguns críticos como egocêntrico, alienado, autoelogioso, cabotino, trivial e toda uma série de adjetivos que traduzem desdém e, por que não admitir, um certo rancor. Injustiça.
La la land é, sim, um filme apaixonado pela máquina de sonhos que é a indústria cinematográfica americana, a despeito de reconhecer que suas engrenagens não raras vezes ferem (sem remorsos) os sentimentos de quem lida com a máquina pelo lado de dentro. Mas o longa de Damien Chazelle tem o mérito de amar Hollywood pelas razões certas, ou seja, por sua ambição de transformar uma expressão pessoal em arte e não por seu cinismo caça-níqueis condensado em determinadas fórmulas.
Confira o trailer:
Essa visada do diretor está clara na homenagem que seu filme faz a Casablanca (1942). Os sinais estão dados desde o início, quando se nota (seria impossível não notar) um pôster de Ingrid Bergman, a protagonista do clássico de Michael Curtiz, decorando o quarto da aspirante a atriz Mia (Emma Stone). No início de seu enamoramento por Mia, Sebastian (Ryan Gosling) pergunta a ela ''quem é o seu Bogart?''. A resposta só virá na última cena do filme.
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Convém lembrar que Casablanca é a história de uma paixão que seria arrebatadora. Mas estamos na Segunda Guerra Mundial. Há mais coisas em jogo do que uma flechada do cupido. E Rick (Humphrey Bogart) e Ilsa (Ingrid Bergman) são daquela classe de pessoas que colocam as virtudes acima de seus instintos. Por isso, Casablanca é, ao fim e ao cabo, um filme sobre a renúncia.
Entre as frases que o longa de Curtiz inscreveu definitivamente na história do cinema – além de ''Play it again, Sam'' e ''Sempre teremos Paris'' – está ''I’d bet they’re asleep all over America'' (algo como ''Eu apostaria que, nos Estados Unidos, todos estão dormindo''). Trata-se de uma resposta de Rick a uma pergunta sobre o fuso horário, mas pode ser interpretada como uma crítica – sutil, elegante e subliminar – ao posicionamento dos americanos em relação ao conflito e um recado de Curtiz de que, apenas insinuando, às vezes se diz muito.
La la land também manda recados sutis, como ''um brinde aos tolos que sonham''. E também é um filme sobre a renúncia, lançado na transição da Era Obama para a Era Trump. Defender essa virtude e afirmar a beleza do gesto de abrir mão de uma satisfação pessoal em nome do bem alheio não deveria soar fútil. Talvez seja a mensagem certa para a sua época. Portanto, apure seus ouvidos, escute o que Chazelle tem a dizer e deixe-se apaixonar – sem culpa – por La la land.