Não tem mistério. A estrutura é montada a partir de pequenos motores nas rodas traseiras das bicicletas e a energia é produzida ao pedalar e conduzida para um gerador maior, que alimenta o projetor e o sistema de iluminação. São 10 bikes fixas e ainda há motores livres para quem quiser instalar a própria magrela trazida de casa. Com a roda levemente suspensa, ninguém sai do lugar e é possível acompanhar o filme ao longo da pedalada. Também há um “pedal manual” para cadeirantes ou portadores de necessidades especiais que impeçam a movimentação das pernas. Uma proposta bem democrática, refletida na diversidade do público formado por mulheres, homens, crianças e pessoas mais velhas.
Para participar basta ter disposição.
Foi o que ocorreu com este repórter, que passou a vez em pouco mais de cinco minutos sobre a bike. Com muito mais preparo, a estudante Marina Oliveira, de 24 anos durou bem mais tempo alimentando o gerador. “Conheci o projeto por causa da Virada e achei fantástica a ideia, estou gostando muito, o lugar é lindo e é muito bom produzir uma energia limpa e me sentir parte do filme”, disse a jovem que havia ido Horto ao Parque Municipal de bicicleta.
Elegante, de sapatos, cinto e blusa para dentro da calça, o comerciário aposentado Tarcísio Rodrigues, de 57 anos, também transformou sua pedalada em filme. “Pedalar é uma delícia, é saudável, adorei participar”, contou o jovial senhor que tinha como única reclamação o fato de O menino e o mundo, filme nacional que era exibido graças às pedaladas do público, não ter lavado o Oscar de melhor animação neste ano. Apesar de indicado, a produção brasileira foi superada por Divertidamente. “O que eles têm contra a gente?”, indagou Tarcísio, que, depois de pedalar, procurou uma das várias cadeiras espalhadas pelo gramado à beira do lago do parque para acompanhar o restante da sessão ao lado da plateia que desfrutava do exercício dos “cine ciclistas”.
Quem assiste a O menino o mundo, dirigido por Alê Abreu, fatalmente cria algum tipo de questionamento sobre a vida nas grandes cidades e a superficialidade das relações marcadas pelo consumo de bens cada vez mais descartáveis De maneira sutil e delicada, a animação mostra bem o contraste entre a vida no campo, onde o homem é conectado com a natureza ao redor, e a vida caótica nas metrópoles, em que a poluição acaba contaminando até as nossas almas. A experiência de ver exatamente esse filme enquanto se produz, com o esforço do próprio corpo, a energia a ser consumida pela exibição, é quase uma fantástica metalinguagem. O público pôde assistir, participar e ainda repor as energias nas foodbikes: bicicletas adaptadas para vender comida. Era possível encontrar espetinhos, pizzaria, cachorro-quente e doces à venda sobre duas rodas.
“Nossa proposta é a reflexão sobre o meio ambiente, mostrar que o planeta é feito de recursos finitos e que energia é coisa séria”, explica Adriana Dutra, diretora da Inffinito, empresa de audiovisual responsável pela realização do Cine Pedal.
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