Este é o quarto ano consecutivo que a sala Web estará em atividade, numa parceria com o site Festival Scope. São disponibilizados 400 ingressos para a sessão on-line de cada filme. A ‘entrada’ avulsa custa 4 euros ou 10 euros o pacote que dá direito a assistir a cinco produções.
“As formas de exibição de filmes têm se alterado, e não há como resistir a isso. Obviamente, há filmes grandes com estratégias comerciais globais que podem achar que não é o caso (divulgar por streaming). Queremos que o filme seja visto. Queremos que o cinema seja apresentado ao mundo em todas as telas possíveis”, diz Vânia Catani, produtora de 'Mate-me por favor'.
“Acho ótimo, até para que as pessoas falem mais sobre o filme. Espero que essa moda pegue. Até como espectadora. Temos acesso a filmes incríveis que nem chegam a ser distribuídos no Brasil. É uma oportunidade para a gente poder acompanhar diretores do resto do mundo”, afirma a diretora Anita Rocha da Silveira, que, aos 30 anos, estreia no formato de longa-metragem.
“É uma iniciativa que me parece andar com a tecnologia. Inclusive, acho que é um caminho natural dos festivais para aumentar o público. Eles acabam ficando muito restritos. Não sabia disso, e agora quero comprar o meu ingresso”, comenta o cineasta mineiro Cris Azzi. O diretor de 'O dia do Galo' sempre foi um entusiasta das novas janelas.
Em 2013, Azzi filmou 'Cada dia uma vida inteira' pensando em lançar apenas na web. Como o longa despertou o interesse de um canal de televisão, acabou estreando primeiro na TV para depois estar disponível em outras janelas. Para Cris Azzi, a expansão das telas começa a influenciar a maneira de filmar.
Desde quando ele foi assistente de direção de Karim Aïnouz em 'Abismo prateado' (2011), pensa sobre como a variedade de telas tem afetado a gramática das obras. Conceber um plano geral pensando na telona do cinema é muito diferente de usar esse mesmo recurso para uma produção que será exibida também na telinha de um celular. “De alguma forma, temos ‘desaprendido’ o que é essa dimensão do plano geral. Talvez na hora da filmagem já não consiga ter essa relação tão clara da proporção do personagem”, constata o diretor.
Como foi planejado para a internet, Cada dia uma vida inteira teve planos propositalmente mais fechados. Já com 'Luna', o longa que Cris Azzi planeja filmar no ano que vem nos arredores de Belo Horizonte, o processo será diferente. “Já é garantido que esse filme vai passar pela sala de cinema. Então, no momento de filmar, prioritariamente vamos responder a essa gramática. Depois, o filme vai ter que se adequar”, explica.
FERRAMENTA Com 'O dia do Galo', o processo foi totalmente diferente. Antes de ser lançado no cinema como um longa-metragem, o documentário teve uma versão curta lançada na internet. “A gente não sabia se o fato de estar disponível atrapalharia a carreira do longa. Mas não. A internet foi a maior ferramenta de divulgação do filme”, conta.
O curta 'O dia do Galo' foi visualizado 447 mil vezes no YouTube. O longa ficou em cartaz durante quatro semanas em Belo Horizonte, tendo também passado por telas de Contagem, Sete Lagoas, Montes Claros, Uberlândia e Divinópolis. Permanece em cartaz no cinema de Oliveira, na Região Central de Minas. Em outubro, será exibido em Nova York. Ainda neste mês de setembro, o documentário deve estrear em plataformas de vídeo sob demanda.
A dificuldade da distribuição para tantas janelas tem sido entender qual o modelo que mais bem se adapta ao perfil dos filmes e, respectivamente, ao seu público. Atualmente, existe a divisão entre VoD (Video on-Demand), o streaming, pelo qual o espectador assiste sem pagar por isso, SVoD (Subscription Video on-Demand), modalidade de assinatura e o TvoD (Transaction Video on-Demand), baseada no modelo de transações de venda ou aluguel.
Cris Azzi faz um paralelo entre a redução da tela e as discussões que atualmente ganham espaço na mídia sobre serviços oferecidos por plataformas e aplicativos como Uber, WhatsApp, Netflix. “São processos irreversíveis, e a gente ainda não tem resposta sobre como a cinematografia vai dar conta de tantas janelas”, afirma.
O YouTube inaugurou em 2012 uma plataforma para venda e aluguel de filmes. Atualmente, estão inscritos no canal mais de 5 milhões de usuários. Funciona tal qual uma locadora tradicional, inclusive com as produções separadas por gênero. É possível contratar tanto blockbusters, como 'Mad Max' (2015), por R$ 6,90 como documentários como 'Belo Monte – O anúncio de uma guerra' (2012), produzido pela O2 Filmes, por R$ 3,90. No caso do aluguel, o filme fica disponível pelo período que o usuário contratar, a partir da primeira visualização. As compras não expiram.
SEM TV Faz cinco anos que o estudante Guilherme Diamantino, de 23 anos, sequer liga a televisão. Mas ver filmes é uma constância na rotina dele. O jovem garante que, desde 2012, conseguiu ver quase a totalidade do catálogo disponibilizado pela Netflix no Brasil. “É mais fácil esperar o filme sair na internet do que eu ir ao cinema”, afirma.
O tamanho da tela não importa para Guilherme. O celular tem sido ferramenta frequente para conferir até mesmo longas-metragens. “Uso qualquer tela. Como a internet melhorou bastante nos últimos anos, procuro sempre ver on-line, para não ficar baixando”, conta. Adepto de múltiplas telas, o estudante pontua a diferença nas experiências. “Acho que o cinema tem esse ritual por trás. Você dedica um tempo real, não é um passatempo. Sai de casa, compra o ingresso. São intuitos diferentes. Quando assisto em outras plataformas, é mais para passar o tempo. Até a minha concentração é outra.”
Cris Azzi concorda que o glamour da sala de cinema faz diferença. Mas ressalta: todas essas plataformas são legais para “seguir o fluxo, cortar caminho e chegar ao espectador”. Já não importa como. O importante é chegar às pessoas.