Londres – O ator egípcio Omar Sharif, cujo nome verdadeiro era Michel Chalhoub, uma lenda do cinema por seus papéis em Lawrence da Arábia e Doutor Jivago, morreu no Cairo, ontem, depois de sofrer um ataque caríaco. Com 83 anos, Sharif havia se afastado da vida pública. Seu único filho, Tarek, anunciou a doença do pai, em maio deste ano, ao jornal espanhol El Mundo: “Meu pai tem Alzheimer. É difícil determinar em que fase está”. Seu agente, Steve Kenis, afirmou ontem que ele vivia em um hospital especializado na doença, no Cairo.
Sharif nasceu em Alexandria, no Egito e, após estudar matemática e física na Universidade do Cairo, aceitou trabalhar cinco anos com seu pai, apesar de já sonhar com os palcos. Estudou na Royal Academy of Dramatic Arts (Rada), em Londres, e passou muitos anos vivendo entre a França, Itália e Estados Unidos antes de voltar para seu país natal. O ator ganhou fama internacional por seu papel no filme Lawrence da Arábia, de 1962, em que o ator Peter O’Toole vivia o papel-título. Sua atuação no épico dirigido por David Lean lhe rendeu um prêmio Globo de Ouro. O filme ganhou sete Oscars, incluindo o de melhor filme, direção (David Lean). Peter O’Toole foi indicado para ator e Sharif para coadjuvante (sua única nomeação na Academia), mas perdeu para Ed Begley, ator de Doce pássaro da juventude.
A relação entre o ator e o diretor se manteve em outro épico de 1965, Doutor Jivago. Baseado no romance de Boris Pasternak, a narrativa se passa na Rússia antes e depois da Revolução Russa de 1917. Sharif vive o médico à procura de sua filha e o filme é considerado seu maior sucesso. O filme levou cinco estatuetas do Oscar, mas perdeu o principal para A noviça rebelde. Sua carreira teve início na década de 1950, com sua estreia em 1954, no filme de aventura Devil of the Sahara (Diabo do Saara). Em poucos anos, Sharif já era considerado uma estrela em seu próprio país. Em 1955, casou-se com a renomada atriz Faten Hamama, com quem teve seu único filho, Tarek. Para se casar, converteu-se ao islamismo e mudou seu nome para Omar al-Sharif.
Galã Em Hollywood, Sharif decidiu se divorciar de sua esposa em 1974 porque, segundo ele, “rodeado por belas mulheres, estava convencido de que acabaria me apaixonando por alguém e não queria humilhá-la, nem impedir que ela refizesse sua vida”. Eterno galã, o ator de bigode elegante e voz rouca acabou nunca mais se apaixonando e negou a maioria de suas conhecidas conquistas amorosas.
De humor refinado, preferia levar uma vida de nômade. “Eu sou o único ator do mundo que é um estranho em toda parte. Tinha sempre a mala pronta, estava sempre em hotéis de luxo, como um convidado”, contou. Conhecido por seu sorriso charmoso, estrelou outros filmes como Funny girl – A garota genial, que marcou a estreia de Barbra Streisand no cinema. Em 1969, interpretou o revolucionário argentino Che Guevara em Che!. Coroado em 2003 com o Leão de Ouro no Festival de Cinema de Veneza pelo conjunto de sua carreira. Em 2004, ganhou o prêmio Cesar de melhor ator, o equivalente francês ao Oscar, por seu papel no filme francês Uma amizade sem fronteiras (Monsieur Ibrahim et Les fleurs du Coran), que marcou seu retorno ao cinema.
Sharif também ficou conhecido por seu gosto pelo jogo e corridas de cavalo. Ele foi considerado um dos mais renomados jogadores de bridge do mundo e escreveu diversos livros e manteve uma coluna no jornal Chicago Tribune sobre o jogo de cartas. Em 2006, ele declarou que não jogava mais. “Decidi que não quero mais ser escravo de nenhuma paixão exceto meu trabalho. Tinha muitas paixões, o bridge, cavalos, jogos. Quero uma vida diferente, ficar mais com a minha família porque não lhe dediquei tempo suficiente”, disse. Sharif havia admitido que gastava muito dinheiro com jogo e que acabava fazendo muitos filmes ruins para sustentar a família.
Crítico dos Estados Unidos, o ator que viveu muitos anos no país disse, certa ocasião, que “apenas 10% dos americanos têm um passaporte, 90% nunca saiu do país”. “Eles não sabem nada. O homem típico do Oriente Médio é muito mais inteligente”. Sobre a Guerra do Iraque, iniciada em 2003 pelo então presidente George W. Bush, Sharif contou que havia dito ao presidente, antes do começo da invasão americana: “Esqueça disso. Nós, árabes, não somos como países normais. Vocês vão se afogar lá”. E, com humor, completou: “Ele não acreditou em mim”.