Há um ano, durante o Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary, na República Tcheca, Bárbara Sturm, diretora da distribuidora Pandora Filmes, ficou impressionada com a produção croata Os filhos do padre. Ao comprar o longa-metragem do diretor Vinko Bresan para exibi-lo no Brasil, ela resolveu fazer diferente. Em seu país natal, o filme – que em tom de tragicomédia conta a história de um jovem pároco que decide furar preservativos ainda embalados para aumentar a taxa de natalidade na ilha onde vive – tinha como pôster o personagem no meio de um monte de bebês. “Você tem que saber qual é o seu público, como pode chamar a atenção dele”, afirma Bárbara. No Brasil, o cartaz de Os filhos do padre traz uma imagem totalmente diferente daquela que foi difundida na Croácia. Aqui, o padre aparece furando as camisinhas.
Lançado em março, uma das raras produções croatas exibidas no circuito comercial brasileiro, Os filhos do padre, já mostrado em BH, fez, com apenas cinco cópias, 33 mil espectadores. E continua em cartaz no Rio de Janeiro, depois de 13 semanas. É um caso de um bom filme que funcionou no boca a boca. “A gente gasta uma energia imensa para o lançamento de um filme como Os filhos do padre para conseguir um resultado xis. Pois gastamos a mesma energia com um diretor famoso e o resultado é cinco xis”, explica Bárbara.
Uma coisa é lançar um filme francês, outra é um croata. Ou até mesmo paraguaio. Diretora da Tucumán Filmes, Priscila Miranda do Rosário comenta que, durante a recente edição do Festival Varilux de Cinema Francês, dois dos filmes da distribuidora, Uma relação delicada e Um amor em Paris, ambos estrelados por Isabelle Huppert, venderam 10 mil ingressos. E isso somente durante a mostra – Um amor em Paris só vai entrar no circuito comercial na próxima semana. “O Brasil é um dos principais mercados para o cinema francês”, comenta ela. Ou seja, o público está muito mais aberto a um longa da França do que do Paraguai.
Mesmo assim, a Tucumán vem colhendo números consideráveis da produção 7 caixas, primeiro filme paraguaio que distribui. Em cartaz desde o fim de abril, a história de um adolescente que trabalha num mercado e recebe uma nota de US$ 100 para transportar sete caixas cujo conteúdo desconhece é uma espécie de Cidade de Deus do país vizinho. Somente no Paraguai, levou 350 mil espectadores aos cinemas – no Brasil, foram 12 mil. “Neste caso, a nacionalidade ficou como uma coisa curiosa. Mas não encontramos qualquer dificuldade com ele, é um filmaço, passou em 70 festivais no mundo e vendeu direitos para remake para os Estados Unidos. Ou seja, é um case de sucesso”, Priscila comenta.
LATINOS EM ALTA
Um sucesso comercial vindo de um país que não tem qualquer tradição cinematográfica acaba chamando a atenção para a sua cinematografia. Países latinos que vêm sendo cotados no meio do cinema autoral são o Equador e a Colômbia, na opinião de Priscila. A distribuidora maranhense Lume Filmes está apostando numa produção venezuelana, o drama Hermano – sobre garotos pobres que jogam futebol numa favela de Caracas e têm a chance de mudar de vida quando são vistos por um olheiro de um grande time –, que estreou esta semana no Rio de Janeiro. “É um filme que ganhou vários prêmios de público em diferentes continentes”, comenta o diretor de produção Mauricio Escobar. Recebendo prêmios em festivais de Moscou e São Paulo, a produção dá provas de que consegue atingir um público universal.
“O trabalho da Lume é mostrar para o público que existe outra visão de cinema”, continua Escobar. No catálogo da distribuidora, que já foge do senso comum ao atuar fora do eixo Rio/São Paulo, há boa parte de produções nacionais independentes e de países distantes, como Sérvia e Croácia. “E a diferença principal é que um filme brasileiro pode ser lançado com apoio da Ancine. Ou seja, você conta com um orçamento maior para a distribuição. Além disso, como existe a cota da produção nacional, você encontra mais salas para exibir”, acrescenta ele.
FRANÇA É EXEMPLO
Isso também vale para outros países. Francesca Azzi, da Zeta Filmes, produtora que entrou há poucos anos no mercado da distribuição, cita a França como o melhor exemplo. “É um dos países mais organizados para a distribuição de cinema. Quando você compra um filme francês, ele já conta com algum incentivo para a distribuição. Tanto a embaixada quanto os consulados são muito articulados.” Ou seja, a política de estímulo do audiovisual faz com que o número de produções que chegam aqui seja maior, isso sem falar na tradição cinematográfica do próprio país. Se não existe o incentivo – o que ocorre com a maior parte dos filmes independentes de diferentes países –, o trabalho tem que ser de formiguinha. Poucas cópias e lançamentos em poucas cidades, uma de cada vez.
Mas cada caso é um caso. Francesca cita como exemplo Um episódio na vida de um catador de ferro-velho, produção bósnia. O filme ganhou três prêmios no Festival de Cinema Berlim em 2013 e é de um diretor conhecido do meio, Danis Tanovic, vencedor do Oscar de filme estrangeiro por Terra de ninguém (2001). Mesmo com tais credenciais, o drama não foi bem nas salas. “Quando um filme ganha prêmio em diversos festivais, a gente acredita que ele seja viável de ser lançado nos cinemas. Mas, às vezes, o mercado diz que não. Não há uma correspondência de audiência para determinados filmes. No entanto, não acho que seja porque ele seja bósnio, húngaro ou francês. É o atrativo do próprio filme.”
E já que ninguém sabe a fórmula do pote de ouro, Francesca comenta que um dos longas mais vistos do catálogo da Zeta é o húngaro Apenas o vento, de Benedek Fliegauf. “Por que, eu não sei. É um filme sobre ciganos, violência contra crianças, que são temas difíceis. Mas, mesmo com todas as dificuldades, conseguimos alavancar um filme complexo. Ou seja, acho que em qualquer lugar se pode ou fazer uma boa bilheteria ou fracassar. Há filmes que atraem e outros que não atraem as pessoas.” Independentemente da nacionalidade.
Fora do eixo
Filmes que chegaram ao circuito comercial (até esta semana)
América Latina
. Crônica do fim do mundo (Colômbia, de Mauricio Cuervo Rincón)
. O fantástico mundo de Juan Orol (México, de Sebastian del Amo)
. Heli (México, de Amat Escalante)
. Hermano (Venezuela, de Marcel Rasquin)
. Não aceitamos devoluções (México, de Eugenio Derbez)
. Pelo malo (Venezuela, de Mariana Rondón)
. 7 Caixas (Paraguai, de Juan Carlos Maneglia)
Ásia
. A imagem que falta (Camboja, de Rithy Panh)
Europa
. Um episódio na vida de um catador de ferro-velho
(Bósnia-Herzegovina/França/Eslovênia/Itália, de Danis Tanovic)
. Os filhos do padre (Croácia, de Vinko Bresan)
. Instinto materno (Romênia, de Calin Peter Netzer)
. Oslo, 31 de agosto (Noruega, de Joachim Trier)
. Walesa (Polônia, de Andrzej Wajda)
Filmes que ainda vão estrear no circuito comercial (até o fim do ano)
. Eco planet (Tailândia, de Kompin Kemgumnird)
. Paraíso (México, de Mariana Chenillo)
. A pedra da paciência (Afeganistão, de Atiq Rahimi)
. Sobrevivente (Islândia, de Baltasar Kormákur)
Lançado em março, uma das raras produções croatas exibidas no circuito comercial brasileiro, Os filhos do padre, já mostrado em BH, fez, com apenas cinco cópias, 33 mil espectadores. E continua em cartaz no Rio de Janeiro, depois de 13 semanas. É um caso de um bom filme que funcionou no boca a boca. “A gente gasta uma energia imensa para o lançamento de um filme como Os filhos do padre para conseguir um resultado xis. Pois gastamos a mesma energia com um diretor famoso e o resultado é cinco xis”, explica Bárbara.
Uma coisa é lançar um filme francês, outra é um croata. Ou até mesmo paraguaio. Diretora da Tucumán Filmes, Priscila Miranda do Rosário comenta que, durante a recente edição do Festival Varilux de Cinema Francês, dois dos filmes da distribuidora, Uma relação delicada e Um amor em Paris, ambos estrelados por Isabelle Huppert, venderam 10 mil ingressos. E isso somente durante a mostra – Um amor em Paris só vai entrar no circuito comercial na próxima semana. “O Brasil é um dos principais mercados para o cinema francês”, comenta ela. Ou seja, o público está muito mais aberto a um longa da França do que do Paraguai.
Mesmo assim, a Tucumán vem colhendo números consideráveis da produção 7 caixas, primeiro filme paraguaio que distribui. Em cartaz desde o fim de abril, a história de um adolescente que trabalha num mercado e recebe uma nota de US$ 100 para transportar sete caixas cujo conteúdo desconhece é uma espécie de Cidade de Deus do país vizinho. Somente no Paraguai, levou 350 mil espectadores aos cinemas – no Brasil, foram 12 mil. “Neste caso, a nacionalidade ficou como uma coisa curiosa. Mas não encontramos qualquer dificuldade com ele, é um filmaço, passou em 70 festivais no mundo e vendeu direitos para remake para os Estados Unidos. Ou seja, é um case de sucesso”, Priscila comenta.
LATINOS EM ALTA
Um sucesso comercial vindo de um país que não tem qualquer tradição cinematográfica acaba chamando a atenção para a sua cinematografia. Países latinos que vêm sendo cotados no meio do cinema autoral são o Equador e a Colômbia, na opinião de Priscila. A distribuidora maranhense Lume Filmes está apostando numa produção venezuelana, o drama Hermano – sobre garotos pobres que jogam futebol numa favela de Caracas e têm a chance de mudar de vida quando são vistos por um olheiro de um grande time –, que estreou esta semana no Rio de Janeiro. “É um filme que ganhou vários prêmios de público em diferentes continentes”, comenta o diretor de produção Mauricio Escobar. Recebendo prêmios em festivais de Moscou e São Paulo, a produção dá provas de que consegue atingir um público universal.
“O trabalho da Lume é mostrar para o público que existe outra visão de cinema”, continua Escobar. No catálogo da distribuidora, que já foge do senso comum ao atuar fora do eixo Rio/São Paulo, há boa parte de produções nacionais independentes e de países distantes, como Sérvia e Croácia. “E a diferença principal é que um filme brasileiro pode ser lançado com apoio da Ancine. Ou seja, você conta com um orçamento maior para a distribuição. Além disso, como existe a cota da produção nacional, você encontra mais salas para exibir”, acrescenta ele.
FRANÇA É EXEMPLO
Isso também vale para outros países. Francesca Azzi, da Zeta Filmes, produtora que entrou há poucos anos no mercado da distribuição, cita a França como o melhor exemplo. “É um dos países mais organizados para a distribuição de cinema. Quando você compra um filme francês, ele já conta com algum incentivo para a distribuição. Tanto a embaixada quanto os consulados são muito articulados.” Ou seja, a política de estímulo do audiovisual faz com que o número de produções que chegam aqui seja maior, isso sem falar na tradição cinematográfica do próprio país. Se não existe o incentivo – o que ocorre com a maior parte dos filmes independentes de diferentes países –, o trabalho tem que ser de formiguinha. Poucas cópias e lançamentos em poucas cidades, uma de cada vez.
Mas cada caso é um caso. Francesca cita como exemplo Um episódio na vida de um catador de ferro-velho, produção bósnia. O filme ganhou três prêmios no Festival de Cinema Berlim em 2013 e é de um diretor conhecido do meio, Danis Tanovic, vencedor do Oscar de filme estrangeiro por Terra de ninguém (2001). Mesmo com tais credenciais, o drama não foi bem nas salas. “Quando um filme ganha prêmio em diversos festivais, a gente acredita que ele seja viável de ser lançado nos cinemas. Mas, às vezes, o mercado diz que não. Não há uma correspondência de audiência para determinados filmes. No entanto, não acho que seja porque ele seja bósnio, húngaro ou francês. É o atrativo do próprio filme.”
E já que ninguém sabe a fórmula do pote de ouro, Francesca comenta que um dos longas mais vistos do catálogo da Zeta é o húngaro Apenas o vento, de Benedek Fliegauf. “Por que, eu não sei. É um filme sobre ciganos, violência contra crianças, que são temas difíceis. Mas, mesmo com todas as dificuldades, conseguimos alavancar um filme complexo. Ou seja, acho que em qualquer lugar se pode ou fazer uma boa bilheteria ou fracassar. Há filmes que atraem e outros que não atraem as pessoas.” Independentemente da nacionalidade.
Fora do eixo
Filmes que chegaram ao circuito comercial (até esta semana)
América Latina
. Crônica do fim do mundo (Colômbia, de Mauricio Cuervo Rincón)
. O fantástico mundo de Juan Orol (México, de Sebastian del Amo)
. Heli (México, de Amat Escalante)
. Hermano (Venezuela, de Marcel Rasquin)
. Não aceitamos devoluções (México, de Eugenio Derbez)
. Pelo malo (Venezuela, de Mariana Rondón)
. 7 Caixas (Paraguai, de Juan Carlos Maneglia)
Ásia
. A imagem que falta (Camboja, de Rithy Panh)
Europa
. Um episódio na vida de um catador de ferro-velho
(Bósnia-Herzegovina/França/Eslovênia/Itália, de Danis Tanovic)
. Os filhos do padre (Croácia, de Vinko Bresan)
. Instinto materno (Romênia, de Calin Peter Netzer)
. Oslo, 31 de agosto (Noruega, de Joachim Trier)
. Walesa (Polônia, de Andrzej Wajda)
Filmes que ainda vão estrear no circuito comercial (até o fim do ano)
. Eco planet (Tailândia, de Kompin Kemgumnird)
. Paraíso (México, de Mariana Chenillo)
. A pedra da paciência (Afeganistão, de Atiq Rahimi)
. Sobrevivente (Islândia, de Baltasar Kormákur)