“Você acredita que uma amiga falou que isso de pregar cartaz era uma coisa juvenil?”, pergunta Sávio Leite, enquanto se organiza para afixar o material de divulgação da 11ª edição da Mostra Udigrudi Mundial de Animação, a Mumia, em uma das paredes do Bolão. Ele fez o mesmo na pizzaria Parada do Cardoso, também em Santa Tereza, e em diversos outros pontos da cidade. Claro que o julgamento da amiga é tomado com bom humor.
saiba mais
A edição que marca os 10 anos da Múmia vai desta quarta até o dia 31 deste mês, em 12 espaços de Belo Horizonte e Nova Lima. Além de telas tradicionalmente abertas a esse tipo de empreitada, como o Cine Humberto Mauro e o Cine José Tavares de Barros, no Sesc Palladium, a Mumia também vai a quatro cineclubes e outros espaços à margem da região Centro-Sul.
“A mostra nasceu com essa filosofia de ser um pouco outsider, fora do eixo, lado B. Só que em 10 anos cresceu muito”, surpreende-se o idealizador. Formado em relações públicas em 1993, o cinema entrou na vida de Sávio Leite como forma de deixar contribuição para gerações futuras. “Talvez almejasse a eternidade a partir daí”, diz.
Nesse desejo, além de organizar a mostra, tem uma produção ininterrupta. Já são 17 curtas realizados de maneira independente, outros três feitos com apoio de leis de incentivo. Ele publicou ainda o livro 'Subversivos: o desenvolvimento do cinema de animação em Minas Gerais', com entrevistas com os principais realizadores do cinema de animação no estado. Sávio também já trabalha no argumento do que virá a ser seu primeiro longa-metragem: a adaptação do livro 'O amanunense Belmiro', de Ciro dos Anjos.
“O romance foi escrito em Belo Horizonte, em 1937. Acho interessante para animação porque é muito psicológico. Como se passa na cabeça do personagem, dá para criar umas fantasias interessantes”, adianta. O primeiro trabalho como diretor foi de um videoclipe para a banda Baratas Tontas, em 1994. Logo depois, foi tomado pelo cinema de animação, quando se dedicou ao making of do curta 'Castelos de vento', de Tania Anaya, antes de frequentar uma oficina no Festival de Inverno em 1997.
Foi lá que chegou com uma ideia preconcebida do que seria fazer um filme em animação e saiu certo de que o gênero não era exatamente uma brincadeira. “Quando fui fazer o filme, vi como era difícil. Não fiz nem 1% do que pensei”, conta. Foi aí que gostou ainda mais. O fã da literatura de Bukowski, da música de Sonic Youth e das linguagens de Glauber Rocha e Godard acabou encontrando seu lugar.
“Para fazer animação você precisa ser muito mais louco, porque não tem limite. Vi que era muito mais interessante, por essa capacidade de expandir”, diz. Em 'Mirmidões' (2001), juntou aos próprios traços imagens feitas por Clécius Rodrigues. Foi com esse filme que começou a circular festivais. Ao conhecer por dentro as mostras, passou a questionar a lógica vigente nas seleções. Foi daí que teve a ideia de criar a Mumia.
Lado B
Já em sua origem, a mostra se diferenciou das demais pelo caráter democrático. Não existe seleção. Sendo curta de animação, está dentro. Este ano, serão 200 filmes, de 25 países. É impossível tentar traçar qualquer paralelo entre os estilos. “A gente é lado B mesmo. Quem vai à Mumia vai ver coisas que não tem em lugar nenhum, feita de maneira completamente independente, vinda de realizadores obscuros, muitos fora do eixo”, reafirma. Na tela democrática da Mumia, a única regra é que seja tudo junto e misturado. “O grande barato é cada um descobrir o filme por si só. A seleção natural quem faz é o público”, propõe.
Para Sávio Leite, a 11ª edição da Mumia inaugura um momento de repensar seu futuro, assim como o da animação brasileira. “O que a gente pretende enquanto festival? A vontade que tenho é voltar a ser pequeno”, confessa. O criador quer mais: que o cinema de animação também seja olhado cada vez mais como uma arte elaborada, adulta e absolutamente desafiadora.
História animada
Único longa-metragem na programação da Mumia, Luz, anima, ação é um documentário de Eduardo Calvet. O filme resgata a memória audiovisual brasileira, passando pelas produções feitas para a televisão, a publicidade e também o cinema. As principais personalidades que ajudaram a construir a história do gênero no Brasil dão depoimentos relembrando marcos históricos e criações mais marcantes de todas as épocas.
SÁVIO INDICA:
'Engole ou Cospervilha' (RJ/SP/MG)
"Quarta parte de uma série muito mal-educada que reúne a nata dos animadores brasileiros"
'Ed'(RS)
"Grande surpresa do Rio Grande do Sul, anda sendo premiado internacionalmente"
'Kali, o Vampire' (Portugal)
"As animações internacionais, na sua maioria, são ótimas e destaco o filme de Regina Pessoa, pois é o curta de animação mais premiado no mundo ultimamente. A trilha do curta é do Young Gods"
'Bicho-papão' (MG)
"O Luciano tem um trabalho transgressor em quadrinhos e suas animações são como pérolas de underground"
11ª MUMIA
Do dia 2 ao dia 31. Entrada franca.
PROGRAMAÇÃO
» Cine Humberto Mauro
(Av. Afonso Pena, 1.537, Centro)
. Quarta-feira – Sessões de curtas nacionais, 15h, 16h30, 18h e 19h30; Luz, anima, ação, documentário de Eduardo Calvet, 21h
. Quinta-feira – Sessões de curtas nacionais, 15h e 16h; As aventuras do príncipe Ackmed, de Lotte Reiniger, 17h; curtas mineiros, 18h e 20h.
. Sexta-feira – Sessões de curtas internacionais, 15h, 16h30, 18h e 19h30; Luz, anima, ação, 21h
. Sábado – Sessões de curtas internacionais, 15h, 16h30, 18h e 19h30
» PUC São Gabriel
(Rua Walter Ianini, 255, São Gabriel)
. Quarta e quinta – Sessões de curtas nacionais, 12h e 18h
. Sábado – Sessões de curtas internacionais, 11h e 14h
» Cineclube Uma tela no meu bairro
(Rua Jaime Gomes, 198, Floresta)
. Quinta-feira – Sessões de curtas nacionais, 19h
Mais informações no site do Mumia.