Ainda que mórbido, o trunfo de ser o último filme com o ator Heath Ledger (1979-2008) é o grande chamariz de "O Mundo Imaginário do Doutor Parnassus", que foi exibido na Mostra Internacional do ano passado, mas só chega nesta sexta ao circuito comercial no Brasil.
Nas ruas de uma Londres atual e sombria, a trupe do velho Parnassus (Christopher Plummer) vive das parcas apresentações de seu teatro mambembe. Mas os encantos pregados por seu espelho mágico são reais. O objeto é capaz de transportar quem se aventura a atravessá-lo a um universo de sonhos que satisfaz todo e qualquer desejo do visitante. O grande temor do mágico ilusionista, porém, vai além das posses materiais.
Parnassus é assombrado pelo diabo (Tom Waits), que lhe cobra a dívida de um velho pacto. Para tornar-se um homem imortal, Parnassus, então tentando trapacear, se comprometeu a entregar seu filho ao capeta, quando este completasse 16 anos. Naquela época, ele era um solteiro convicto, mas as artimanhas do diabo o levaram a se apaixonar. Ciente da negociata inevitável, o mágico esconde sua bela Valentina (Lily Cole), que está prestes a completar o fatídico aniversário. Quando o diabo enfim aparece, lança um desafio por novo trato: se Parnassus capturar cinco almas para o inferno, a de sua filha será poupada.
Nesse contexto surge o misterioso Tony (Heath Ledger), moribundo com uma corda no pescoço, a quem a trupe socorre. Ele se apaixona por Valentina e, ao descobrir seu destino, se dispõe a usar o espelho de Parnassus como isca para capturar almas. E atrair visitantes é fácil com o apelo do desejo: o universo do espelho revela-se um lugar onde não há limites e cada um pode ser e ter o que quiser.
Visualmente belíssimas, as paisagens do mundo paralelo parecem inspiradas nas pinturas surrealistas de Salvador Dalí, ora com rios caudalosos por onde passam gôndolas luxuosas, mas também lar de seres fantásticos de pernas muito longas ou sem cabeça. Uma vez dentro do espelho, também Tony tem as feições transformadas. Como Depp, Law e depois Farrell, Tony exibe diversas facetas como o galanteador que recebe os visitantes que adentram o universo paralelo. O que os curiosos não imaginam é que em suas almas se perderão nessa imensidão de luxúria, uma viagem sem volta. A moral do filme e do diretor, um alerta ao capitalismo exacerbado, fazem eco também à triste despedida do protagonista.