Em meio à onda conservadora que levou o candidato de direita Jair Bolsonaro à Presidência, o carnaval do Rio prepara uma edição de desfiles irreverentes que reivindicam o papel das mulheres, dos negros e índios na história do país.
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As escolas de samba que desfilam no Sambódromo enfrentam mais um ano de restrições no orçamento liberado pela prefeitura.
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Assim a Mangueira resgata nomes pouco conhecidos, como os da guerreira negra do século XVII Dandara ou dos rebeldes indígenas Cariri; e afirma que a colonização portuguesa no Brasil foi "mais invasão que descobrimento".
"A gente vem mostrando a bravura dos negros, trazendo nomes importantíssimos, principalmente o nome de mulheres. Grandes nomes, mulheres negras, mas também os índios, mostrando quem são os verdadeiros desbravadores, construtores da historia do Brasil", disse em entrevista à AFP Evelyn Bastos, rainha da bateria da Mangueira, durante o último ensaio aberto na Mangueira, próximo ao Maracanã.
A escola também vai homenagear a vereadora negra Marielle Franco, defensora de Direitos Humanos no complexo da Maré, um dos maiores conjuntos de favelas do Rio, morta a tiros em março do ano passado.
"Marielle tem importância relevante para nós, mulheres negras. Ela é uma referência, venceu as estatísticas.
"Ela é um exemplo, venceu as estatísticas. Uma mulher de muita coragem, muito importante para outras mulheres, para as meninas que acham que não podem ter uma oportunidade pela cor da pele ou pelo comprovante de residência, ela é um exemplo de mulher, de povo", completou Evelyn.
A viúva de Marielle, Mônica Benicio, vai desfilar em uma das alas da escola.
Portela: 'Alta Costura' com Jean-Paul Gaultier
A Portela, outro peso pesado do carnaval carioca, homenageia este ano Clara Nunes, ícone musical dos anos 70 e primeira artista de sua época a defender publicamente - através de suas canções, indumentária e discurso - as religiões afro-brasileiras.
Atualmente "há pessoas discriminadas pela cor de sua pele, por sua religião, por sua opção sexual (...), nesse momento em que os ânimos estão exaltados, uma homenagem a Clara Nunes ressaltando sua bandeira de tolerância religiosa é muito importante", diz Raphael Perucci, assessor de imprensa da Portela.
A escola de Madureira, que completa 96 anos em abril, finaliza suas fantasias e carros alegóricos em seu imenso galpão na Cidade do Samba, onde guarda o maior segredo: as fantasias desenhadas pelo francês Jean-Paul Gaultier junto com a diretora criativa da Portela, Rosa Magalhães.
O estilista de Alta Costura, que não poderá participar do desfile por motivos de saúde, assina duas fantasias (uma masculina e outra feminina), que vão vestir 120 membros da escola em uma ala que recria a obra "Carnaval em Madureira", da pintora brasileira modernista Tarsila do Amaral.
Cortes de dinheiro público
Desde que o pastor licenciado Marcelo Crivella assumiu a prefeitura da cidade, em 2016, o dinheiro destinado a cada escola foi reduzido pela metade. Faltando poucos dias para os suntuosos desfiles, as escolas receberam apenas a metade dos 500.000 reais prometidos, segundo Perucci.
Crivella, que sempre se mostrou pouco simpático à festa de Momo, diz que é preciso substituir lentamente o financiamento público pela iniciativa privada, uma espécie de "desmame" do carnaval.
Mas o corte dos recursos não basta para desanimar as escolas de samba, instituições quase centenárias. Em um país que acaba de deixar para trás uma severa crise econômica e uma eleição cansativa, o carnaval continua sendo um ritual sagrado de catarse coletiva.
"Não podemos desanimar. Desfile na Sapucaí é como se fosse Copa do Mundo. Existe uma cultura do samba e do carnaval. Somos solidários com as tragédias. O carnaval não pode ficar isolado, ele acompanha.
"Não podemos deixar a peteca cair, senão o carnaval não aconteceria no Rio de Janeiro desde o inicio do século contra tudo e contra todos".
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