A música conduz a vida, a alegria alimenta a alma e uma energia contagiante parece mover os dias de William Claudino, de 54 anos, organizador do bloco As Virgens do Formigueiro Quente, que completa 25 anos neste carnaval. Se fosse escolher um tema para simbolizar as trajetórias dele e da agremiação, o morador do Bairro Mantiqueira, na Região de Venda Nova, em Belo Horizonte, não teria dúvidas: seria, com certeza, “não deixe o samba morrer”, nome de um sucesso da cantora Alcione. “Não podemos deixá-lo acabar nunca”, conta William que, no último domingo, esteve à frente de cerca de 500 pessoas cantando, dançando e muitas delas tocando instrumentos de percussão feitos pelas suas mãos.
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Para quem está familiarizado com as festas populares da capital, a definição de dona Teresinha faz todo sentido. É que os integrantes do bloco participam, em junho, do tradicional arraial no qual se transforma a Praça Rui Barbosa (Estação), na Região Centro-Sul – nesse período, entra em cena a força maior do Grupo Cultural Arraiá do Formigueiro Quente, em ação há 52 anos para mostrar a beleza das quadrilhas, com muito caminho da roça, anarriê e balancê. “Participamos do concurso de quadrilhas e do carnaval com o mesmo entusiasmo”, diz William com o sorriso aberto.
Fogueira
A história da quadrilha junina é a deixa para se entender o nome do grupo cultural. Tudo começou há mais de meio século, quando Hamilton e Teresinha se mudaram para a região do Mantiqueira, então muito arborizada. “Era um mato só, não tinha casa nenhuma”, conta William. Na primeira festa junina realizada no terreno, a fogueira foi feita sobre um formigueiro. Não deu outra: quando as labaredas subiam, as formigas saíam da toca. Ficou, assim, batizada a quadrilha. Muito tempo depois, durante uma gincana, alguns rapazes do bairro se vestiram de mulher para uma tarefa e, quando o apresentador lhes perguntou o nome do grupo, não titubearam: As Virgens do Formigueiro Quente. Ficou eternizado o nome curioso e divertido.
William nasceu e cresceu nesse ambiente, tanto que se tornou músico, compositor e luthier (já fez violões, cavaquinhos, guitarras e os instrumentos de percussão), além de serralheiro. Autodidata, revela que a primeira obra surgiu por volta dos 14 anos, ao dar forma a uma guitarra. “Pegou a faca de cozinha e talhou a madeira”, lembra dona Teresinha, que foi porta-bandeira da escola de samba Marajoara e integrou a ala das baianas da Canto da Alvorada, Cidade Jardim e Unidos do Guarani. “E minha filha Lílian foi rainha do samba, mirim, infantil e juvenil, durante oito anos”, acrescenta orgulhosa.
Depois da primeira experiência musical, William não parou mais e aprendeu a conhecer as melhores madeiras para criar os instrumentos; fabricou, aos 22, uma bateria que, de tanto sucesso, foi reproduzida e vendeu a rodo; trabalhou em loja especializada; fez estojos para saxofone e clarineta; e atuou na restauração de outros instrumentos de sopro. Hoje, toca violão, guitarra e contrabaixo em festas, compõe e canta. E mantém o sonho de, um dia, ter uma música de sua autoria gravada pelo cantor Alexandre Pires. “Seria a realização.”
FUTURO
Atento às mudanças do carnaval de BH, William diz que o surgimento de blocos em toda a cidade é muito bem-vindo, pois dá um novo gás à folia. No entanto, acha que as escolas de samba não podem desaparecer do reino de Momo. “Tenho saudade também dos blocos caricatos, tinham uma boa bateria.” E o que pode ser feito? Ele acredita que patrocínio é fundamental para que as escolas possam mostrar sua tradição na Avenida Afono Pena. E, para resumir, o homem de sete instrumentos e “faz tudo” do bloco cita novamente a frase da canção. “Não deixe o samba morrer...”