No ano passado, foram 3 milhões de pessoas. Para 2018, a expectativa é de público 20% maior. Os números consolidam o carnaval de BH como um dos maiores do país, fato inimaginável há cerca de 10 anos, quando as ruas da cidade ficavam quase desertas nos dias reservados à folia. Quase, porque mesmo antes da chamada “retomada” do carnaval de rua, a partir de 2009, já havia quem desfilasse pela capital.
Bem antes de os blocos Baianas Ozadas, Então Brilha! e Juventude Bronzeada arrastarem uma multidão de foliões fantasiados como bem preferirem, a BH carnavalesca tinha como protagonistas os blocos caricatos, que se orgulham de suas décadas dedicadas ao samba e cobram mais apoio das autoridades e do público. Nos anos 1960, os desfiles na Avenida Afonso Pena contavam com cerca de 50 blocos caricatos. Entre os anos 1990 e 2000, os cortejos foram suspensos, mas agremiações como Corsários do Samba, Inocentes de Santa Tereza e Bacharéis do Samba sobreviveram à quase extinção dos blocos caricatos belo-horizontinos. Em 2017, a Afonso Pena recebeu 10 desfiles. Apesar da longevidade, os caricatos perderam em popularidade para os blocos de rua.
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Segundo a Belotur, em 2018, o total de recursos repassados aos blocos caricatos e escolas de samba que cumprirem as determinações do edital será 50% maior que no ano passado. Cada escola do grupo principal receberá R$ 75 mil e cada bloco caricato, R$ 37,5 mil. As inscrições terminam hoje e só depois do anúncio dos selecionados o dinheiro será encaminhado. O Inocentes de Santa Tereza está entre os inscritos, insatisfeito com o valor e com a demora no repasse.
“Há mais de 10 anos lutamos para chegar a esse ponto. Mas o valor ainda é muito pouco para quem quer fazer uma festa bonita.
Responsável pela administração do carnaval de BH, a Belotur se defende, alegando “olhar com carinho” para os blocos caricatos e escolas de samba. “Sinceramente, percebo que a gente precisa sair desse lugar de ‘mimimi’ e ‘choração’.
Malab entende que as agremiações não podem depender exclusivamente do dinheiro repassado pela PBH para viabilizar os desfiles. “O auxílio financeiro coloca uma condição de dependência do poder público. A gente precisa entender que o mundo mudou, não tem cidade com caixa sobrando, a economia pública não se coloca como mantenedora de tudo. Precisamos ter saídas em que o poder público, aliado à iniciativa privada, encontre essas frentes. Trabalhamos muito e, se não estamos agradando, é preciso conversar mais para entender aquilo que eles esperam.
ATRASO O fato de o repasse da verba ocorrer próximo do dia do desfile se deve ao atraso no contrato de patrocínio, alega a Belotur. “É um gargalo, sempre houve atraso. Fizemos nosso planejamento, formalizamos o edital de patrocínio, mas houve um problema de documento. Ele foi cancelado e reaberto só em janeiro. Nosso planejamento original era viabilizar isso em novembro, distribuindo o recurso em dezembro, mas fomos pegos de surpresa”, diz Malab. Ele diz que a burocracia envolve prazos e recursos. “Estamos nos esforçando ao máximo e, mesmo com esse atraso, blocos e escolas vão receber ainda em janeiro, com antecedência que nunca receberam.”
A cobrança de mais recursos vem também de outros grupos carnavalescos. Fundado em 1947, o Leão da Lagoinha desfilou até 1986. Ano passado, retornou às ruas do bairro e à Avenida Afonso Pena, como no passado. “Incorporamos o Leão na associação do bairro e consegui um aporte de R$ 10 mil (de uma fabricante de cerveja).
“Segundo a Belotur, houve aumento dos recursos vindos de patrocinadores, com aumento para blocos caricatos e escolas. Porém, para os blocos de rua não houve aumento. O valor máximo continua R$ 10 mil para os classificados no edital. E nossos instrumentos são caros. Isso não paga nem o cachê de R$ 12,6 mil para os nossos 11 músicos, fora alegoria, abre-alas, equipamento de som, abadás. Um bloco na rua custa R$ 50 mil. Sem desmerecer blocos caricatos e escolas de samba, só com eles a cidade não teria a dimensão de carnaval que tem hoje. É hora de repensar, buscar apoio de empresas privadas, especialmente para blocos de grande porte”, diz Jairo Moreira. Para este ano, os desfiles estão confirmados na Lagoinha, em 11 de fevereiro, e na Afonso Pena, em 13 de fevereiro. “Teremos uma novidade: além dos metais, sairemos com bateria com 30 componentes e um carro abre-alas com um leão de quatro metros de altura”, adianta.
Outra vanguarda do carnaval belo-horizontino, o bloco caricato Aflitos do Anchieta, fundado em 1966, pretende aproveitar o crescimento da folia de rua para se fortalecer, mas também cobra um apoio maior da prefeitura, como explica o atual presidente, Mario Afonso Ligorio. “Já existia essa manifestação popular, mas o carnaval não tinha essa organização de hoje, quando os jovens reacenderam essa chama. Acho muito válido. Bloco de rua nunca atrapalhou bloco caricato. Acredito que a tendência seja melhorar, mas tem que tomar cuidado com comércio. Estão comercializando demais. A estrutura vai ficando comprometida. A relação (com a prefeitura) é amigável, mas eles exigem de mais e colocam de menos. O valor que repassam é quase fictício. Deviam fazer uma coisa mais segura, melhorar a estrutura, que está boa, mas ainda falta. Ainda vemos escolas de samba que beiram o ridículo, porque não têm condições financeiras de colocar coisas melhores”, diz Mário.
Em 2018, a exemplo do ano passado, o Aflitos do Anchieta não desfilará, pois passa por uma reestruturação. O bloco pretende retornar ao desfile oficial no ano que vem. Por enquanto, o grupo planeja um desfile pelas ruas do Anchieta durante o carnaval.
Estudioso dos primórdios do carnaval belo-horizontino, o historiador Marcos Maia defende a harmonia entre todas as partes interessadas e um apoio maior a quem mais precisa. “Se olharmos para trás, quem manteve o carnaval foram principalmente as escolas de samba e os blocos caricatos. Daí a importância de a Belotur e fundações de cultura enxergarem isso como uma manifestação não só turística, mas cultural. É preciso olhar com carinho para eles. E também é preciso se unir, se organizar e parar de brigar. A maioria dos blocos e escolas são de comunidades carentes e acabam marginalizados. Nosso papel de historiador é mostrar como esses grupos são guerreiros, quanto eles amam o samba”, argumenta.
O desfile oficial dos blocos caricatos está marcado para 12 de fevereiro e o das escolas de samba para o dia seguinte, ambos na Avenida Afonso Pena, onde será montada a estrutura para o evento..