Folião de salto alto se destaca à frente do desfile do bloco Magnólia

O Magnólia mostrou que carnaval rima mesmo com todos os ritmos e, com o mix de dança e artes cênicas, faz bonito por onde passa

por Gustavo Werneck 01/03/2017 06:00
Alexandre Guzanshe/EM/DA Press
No alto do salto 15, Sandro Boaventura mostrou elegância à frente do bloco Magnólia (foto: Alexandre Guzanshe/EM/DA Press)
Confesso que nunca ouvi essa palavra e quem me falou, no meio do bloco, foi o mestre de cerimônias do bloco Magnólia, um cara de 1,84m que desfilava na frente, com a maior elegância, sobre sapatos de salto 15. Na mesma hora, juntei “invadir” com “vadiar”, achei bem oportuna a mistura para o carnaval e quis saber detalhes, enquanto a banda do maestro Brasilino contagiava a multidão com o jazz de New Orleans, pelas ruas e avenidas do Bairro Caiçara.

Entre gargalhadas e som alto, Sandro Boaventura me explicou rapidamente o neologismo no meio da muvuca. “Vou invadindo os blocos. Chego e entro, me faço integrante. Sou o verdadeiro folião, palavra que, em francês, tem a ver com loucura. Folie. Difícil mesmo foi encontrar um sapato número 44.” No meu modesto entender, ele está coberto de razão. E sabe do que fala, pois, na vida real, trabalha na área de saúde mental. Achei ótimo e vou guardar: invadiação!.

O Magnólia mostrou que carnaval rima mesmo com todos os ritmos e, com o mix de dança e artes cênicas, faz bonito por onde passa – ainda mais com a atriz Lira Ribas carregando o estandarte. Muitas vezes, era um La La Land em plena Avenida Pedro II, os casais todos suados rodopiando com o maior charme e agilidade. E as meninas de roupas laranja e preto, com boás, fazendo trenzinho na pista e enchendo a terça-feira gorda de alegria e emoção. Entrei no clima, dei meus passinhos e segui o bloco, meio sem destino. Valeu demais, neste último dia, ver faraós, piratas, baianinhas, melindrosas, índios e cara-pálidas deste Brasil pulando, brincando e se divertindo atrás da trupe.

Não só eu, mas muita gente gostou, mesmo debaixo da água forte que veio do céu no início da tarde. As amigas de longa data Gracinha, Ana e Vânia ficaram fora da corda de proteção, mas nem por isso deixaram de aproveitar o fuzuê do bloco. Riram, curtiram o som e ensaiaram alguns passos de charleston. “Somos as Luluzinhas”, revelaram, felizes da vida. E aplaudiram o maestro, sabe por quê? Brasilino pediu respeito para as mulheres, apoiou a liberdade de gênero e disse não ao preconceito. Palmas para ele.

Trilha sonora


Fui tomado pelos sons do bloco, minha cabeça encharcada de chuva e alegria do carnaval, minhas pernas dando sinais de que a quarta-feira de cinzas sempre chega para todo mundo, inexoravelmente. E lembrei o quanto a música popular é pródiga, variada, rica e ajuda a gente a tocar o barco da vida. Puxa, se há muita canção eletrizante para festejar Momo, tem outras tantas para encerrar seu reinado. Com poesia.

Basta lembrar que na quarta-feira “tudo volta ao normal”, conforme diz a Noite dos mascarados, de Chico Buarque. E em A felicidade, Tom Jobim e Vinícius de Moraes foram direto ao assunto, sem rodeios: “...pra fazer a fantasia/De rei ou de pirata ou jardineira/Pra tudo se acabar na quarta-feira”.

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(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press )
Andei pelas ruas da cidade sob chuvas de confete em alguns locais, serpentinas voando, cantarolei os versos da minha memória afetiva e fui emendando a outros mais presentes neste carnaval e na boca de todos os blocos. Uma delas é Baianidade Nagô: “Eu queria/Que essa fantasia fosse eterna...” Será que queria mesmo?

E foi então que, mais tarde, já escurecendo, vi uma menina rebolando como se não houvesse amanhã, nem depois, nem depois... E veio outro verso das profundezas da vida: “Ela desatinou/viu chegar quarta-feira/Acabar brincadeira/bandeiras se desmanchando/E ela ainda está sambando..”, também de Chico Buarque.

Mas, de todas, a que mais gosto é Marcha da quarta-feira de cinzas, de Carlinhos Lyra: “E no entanto é preciso cantar/Mais que nunca é preciso cantar/É preciso cantar e alegrar a cidade”. É verdade, arte acima de tudo. Nessa batalha de confetes, passei a crer que o vencedor é quem vive as melhores fantasias. E depois cai (sem medo) na real. Até a próxima, Momo! Valeu!

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