No começo, carnaval de 2010, apenas uma ala de 10 mineiros em meio à folia no Rio de Janeiro. Ontem, quando completou cinco carnavais como bloco, quatro deles desfilando em BH, o Então, Brilha! levou 20 mil pessoas à Rua Guaicurus. “Gente é pra brilhar!” A frase, do poeta russo Vladimir Maiakovski, foi citada em música por Caetano e acabou norteando um dos blocos mais queridos do renascido carnaval belo-horizontino.
Da Guaicurus, “sede” do bloco desde seu primeiro desfile – na terça-feira gorda de 2011, único dia daquele ano em que não choveu durante a folia –, até a Praça da Estação, onde a multidão se dispersou e acabou se misturando com uma outra aglomeração carnavalesca, a Praia da Estação, o caminho não foi fácil. Se em 2014 foram 10 mil pessoas, esperava-se mais gente. Mesmo com a divulgação do horário do bloco apenas algumas horas antes do evento, eles atraíram o dobro de pessoas.
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Pois mesmo com o hino executado fielmente neste horário, somente uma hora depois o carro começou, muito lentamente, a descer. Com a rua já cheia, ambulantes em excesso e inclusive carros estacionados, não havia como sair do lugar. Às 10h, o desfile cruzou a esquina da Rua São Paulo. Pouco depois, houve a decisão, com o aval da Belotur. O percurso seria modificado. Seguiria direto pela Guaicurus, virando na Rua Espírito Santo para chegar mais rapidamente à Avenida dos Andradas, dando mais espaço à bateria e aos foliões.
Para a bateria, conhecida como a melhor entre os blocos de BH, a festa estava acima de tudo. São 400 integrantes, alguns bem fiéis, que participaram dos três ensaios antes deste carnaval. Em cima do carro, Di Souza, tal como um maestro, comanda os ritmistas. Na parte frontal, vocalistas diferentes se dividem em antigas canções de axé.
Com um sabor mineiro, sempre. O mais belo dos belos, uma das canções mais conhecidas do bloco afro Ilê Ayê, teve os versos subvertidos. “Quem é que sobe a ladeira da Guaicurus?”, cantou Michelle Andreazzi em uma das mais planas ruas da região central de BH. O sol já tinha dado as caras, mas o clima ainda estava tranquilo. Pelo menos para a ritmista Paula Miranda, de 27 anos, que, grávida de seis meses de Bento, nem cogitou não integrar a bateria. Mas como o calor apertou, foi descansar no carro de apoio.
TIMBAUS NO COMANDO
Sob o comando de Di Souza, a bateria da Então Brilha! é dividida por seções. Começa com os timbaus (“os mais difíceis”, disse Pedro Thiago, que comanda o setor), depois os repiniques que dão sequência às caixas, até chegarem à parte final, com os surdos. Cada um dos grupos tem seu próprio maestro. Quem está da metade pra frente se dá melhor. É onde estão os integrantes que ensaiam, que já têm uma história com o instrumento. Na parte de trás ficam principalmente turistas acidentais, que chegam para tocar em cima da hora.
À medida que se caminha mais para o final da bateria, a confusão aumenta. Com a rua estreita, excesso de gente e de ambulantes e sem um cordão de proteção, os foliões entram no meio dos ritmistas, gerando empurra-empurra. Houve uma tentativa de fazer um cordão policial logo em frente ao carro de som, mais potente do que nos anos anteriores, para proteger a multidão, sempre muito próxima. Do bloco de 10 amigos, em 2010, para o espetáculo para 20 mil pessoas, o desafio do Então Brilha! é manter o essência de um carnaval que tem axé sem abadá. "Essa quantidade de gente mostra que BH quer carnaval", ressalta Jasão, um dos organizadores.
Apesar do aperto, até a chegada à Praça da Estação, sol a pino de meio-dia, a música e a alegria venceram. Que o diga a professora e artista circense Anamel, de 25, que fez sua estreia como ritmista do Então Brilha! grávida de sete meses e meio. E chegou até o final, três horas e meia depois de iniciado o desfile. “Meu médico falou: 'Faz o que você dá conta'”, disse Anamel. Pois já na Praça da Estação, com o corpo todo tomado de purpurina dourada e ainda empunhando um surdo, ela terminou o trajeto. “Sou obstinada. Chego ao final com tudo o que me proponho a fazer.” Olívia vai nascer em 15 de abril sambando. (Com Flávia Ayer)