Silviano Santiago vem a BH para lançamento do Suplemento Literário

Edição dedicada ao autor será lançada nesta segunda-feira, 16, na Biblioteca Pública Estadual, na Praça da Liberdade

Ana Clara Brant
'Lamento perceber que a literatura vem gradativamente perdendo seu espaço', diz o autor. - Foto: Divulgação

Quando o Suplemento Literário de Minas Gerais foi lançado pelo jornalista Murilo Rubião (1916-1991) em 1966, o escritor e romancista mineiro Silviano Santiago tinha 30 anos e lecionava em universidades norte-americanas. Mesmo morando longe, o autor sempre fez questão de colaborar com a publicação. ''Tenho trabalhos publicados no Suplemento desde o seu início. Murilo Rubião não é da minha geração, mas era muito próximo do meu grupo de amigos, formado por Autran Dourado, Jaime Prado Gouvêa e Vanessa Netto. É uma publicação que sempre teve grande importância para mim'', afirma Santiago.

Silviano é o grande homenageado da próxima edição do Suplemento, que será lançada nesta segunda-feira, 16, com a presença do autor na Biblioteca Pública Estadual, na Praça da Liberdade. Organizado pelo pesquisador e professor titular da faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Wander Melo Miranda, o especial traz 12 textos e reúne nomes como Renato Gomes (PUC-Rio); Evelina Hoisel (UFBA); André Botelho (UFRJ) e Ivete Walty (PUC-Minas). Um dos destaques é a reflexão proposta por Eneida Maria de Souza, professora emérita da UFMG. Sob o título Fim de jogo: Beckett em Belô, Eneida pontua os traços autobiográficos na obra Mil rosas roubadas, publicada em 2014, em que o escritor insere as discussões entre ficção e memória, biografia e autobiografia, para retratar o esforço de um professor de história ao biografar seu amigo que padece no leito de hospital, no caso, o crítico e produtor musical Ezequiel Neves (1935-2010).

''Essa homenagem do Suplemento é tão bonita, tão sincera e, ainda mais vinda do meu estado natal, que os sentimentos que me vêm são alegria e euforia.

Não deixa de ser um tributo ao trabalho de toda uma vida, já que comecei muito cedo. Acredito que tenho uma contribuição longa às artes e, em especial, à literatura'', diz Silviano Santiago.

O romancista e professor de 81 anos ressalta que esse Suplemento Literário especial veio a calhar, num momento em que a literatura, sobretudo o tipo de literatura a que ele se dedica, anda meio em baixa. ''O mundo e o país se tornaram cada vez mais dedicados ao audiovisual. Não que eu seja contra, mas lamento perceber que a literatura, que, desde o renascimento, sempre teve um espaço de comunicação, de reflexão, de conhecimento de saber, vem gradativamente perdendo seu espaço'', lastima.

Morando no Rio de Janeiro desde 1974, Silviano se considera meio ''cigano''. Nascido em Formiga, no Centro-Oeste de Minas, em setembro de 1936, ele se mudou para Belo Horizonte em 1948 e para a Cidade Maravilhosa – em sua primeira passagem – na década de 1960. ''Aí começou meu périplo. Só nos Estados Unidos devo ter ensinado em oito universidades diferentes, o que é bem raro. Morei na França, onde fiz doutorado, no Canadá, dei aulas na Alemanha, no México. A presença do exterior na minha formação sempre foi grande, seja no cinema, na literatura, nas histórias em quadrinhos. Tenho essa coceira intelectual desde a época de Formiga'', conta.

Mesmo vivendo longe de sua terra natal há tanto tempo, Minas Gerais está presente com frequência na obra e na vida de Silviano. ''Meus escritos traduzem a minha própria experiência. Meu estado e minha cidade estão presentes em toda parte, seja nos meus poemas, contos, romances e ensaios. Dois dos meus trabalhos mais importantes se relacionam a autores mineiros que admiro profundamente.
Um dele é Carlos e Mário (organização e notas da correspondência completa entre Mário de Andrade e Carlos Drummond de Andrade) e o meu mais recente projeto, Genealogia da ferocidade, em que ouso analisar o Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa'', pontua.

PRÊMIOS
Ao longo de sua trajetória, o escritor colecionou premiações literárias importantes como o Prêmio Governo de Minas Gerais de Literatura, em 2010, o Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, em 2013, pelo conjunto da obra, e o Oceanos de Literatura em Língua Portuguesa, em 2015. ''Quando você já está mais velho e não precisa de mais dinheiro, acaba ganhando vários prêmios'', brinca Silviano, que concorre ao Jabuti 2017 na categoria Romance com Machado (Companhia das letras).

Na obra, o autor aborda os últimos anos de vida de Machado de Assis (1839-1908) traçando um paralelo entre suas crises nervosas e sua criação literária e retratando conversas confessionais do Bruxo do Cosme Velho com Mário de Alencar, filho de José de Alencar. A cerimônia de entrega do Jabuti ocorrerá em 30 de novembro, em São Paulo. ''O benefício que um prêmio traz não é apenas o dinheiro. O reconhecimento crítico é muito importante e, bem ou mal, tem uma abertura de mercado, seu nome começa a circular mais na mídia e não deixa de ser um incentivo a continuar. Se você conquista um prêmio, é sinal de que está dando certo'', opina.

Justamente por estar no caminho certo há décadas que Silviano Santiago já começou um novo projeto. A publicação – ainda sem data para lançamento definida – é um mergulho corajoso em sua própria infância. “Fiz muita autoficção, e esse novo livro é uma espécie de autobiografia. O mais importante é a narrativa e a experiência que tive na minha juventude. Vou misturar um pouco do que vivi com imaginação”, comenta.
Uma das sugestões de nome para a obra é um poema de Murilo Mendes, O menino sem passado. “É um passado que ele própria inventa; não é herdado. O passado é muito mais uma construção do que uma herança. Não sei se esse título irá permanecer, porque é meio enigmático, mas é o que me governa no momento”, diz.

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