
Segunda mulher à frente da curadoria do evento – assumiu em 2016, 10 anos depois de Ruth Lanna, que ocupou a função no biênio 2005-2006 –, Josélia Aguiar prepara, desde 2011, uma biografia de Jorge Amado. Nascida em Salvador, a jornalista destaca que a cultura negra sempre esteve em seu horizonte. Para escrever o livro sobre o autor de Dona Flor e seus dois maridos, ela retomou um século de história literária e, de alguma maneira, a história tangenciada do movimento negro no Brasil.
“As histórias de Jorge Amado são afro-baianas. Há o momento em que ele estabelece diálogo com a cultura afro-baiana e também há o momento de certo ruído entre Jorge e o movimento”, explica Josélia.
Josélia Aguiar buscou o que é produzido além do eixo Rio-São Paulo e além das grandes empresas do mercado editorial. “A Flip do Lima Barreto me levou até os subúrbios, presentes na trajetória e na obra dele. Busquei autores que não estejam no centro, nas capitais. São novos olhares, formas literárias inusitadas e pouco conhecidas”, explica.
A curadora da Flip observa que, muitas vezes, há críticas à ideia de diversidade, como se ela se contrapusesse à qualidade. “Diversidade e qualidade não são retas paralelas que não se cruzam”, reforça.
MINAS Na programação oficial, há número expressivo de autores mineiros: Ricardo Aleixo, Grace Passô, Ana Maria Gonçalves, Conceição Evaristo, Edimilson de Almeida Pereira e Jacques Fux, além da poeta suíça Prisca Agustoni, que mora em Juiz de Fora e dá aulas na universidade federal de lá. Boa parte deles autores parte de uma “epistemologia afrodiaspórica”, como define Edimilson Pereira.
“Alguns nomes eu queria desde sempre, como o Ricardo Aleixo, artista multimídia e poeta interessantíssimo. Foi uma das primeiras pessoas que convidei. Foi ele quem me falou da Grace Passô”, conta Josélia. “Tinha começado a pesquisar sobre o Edimilson. Quando você começa a pesquisar, não se dá conta de onde as pessoas são. É um povo que vive viajando. Isso tem uma explicação, não é uma coincidência.
Escrita feminina em foco Se a mesa de abertura da Flip, quarta (26) à noite, trouxe Lima Barreto, o encerramento terá uma escritora vinda da periferia – mais precisamente, criada na Favela do Pindura Saia, em BH. “Queria fazer da mesa de encerramento com a Conceição Evaristo algo especial. É interessante a história dela. A comunidade literária negra a conhecia há muito tempo. Ela foi descoberta lá fora, publicada em antologias estrangeiras e começou a interessar aos departamentos de pesquisa. Fortaleceu-se depois de participar do Salão do Livro em Paris, em 2015”, diz a curadora Josélia Aguiar.
Aos 70 anos, a autora belo-horizontina tem recebido homenagens em todo o Brasil. Em São Paulo, sua trajetória foi tema da Ocupação cultural, no Itaú Cultural. Em BH, ganhou uma semana de festividades dentro da 2ª Mostra Conceição Evaristo, promovida pelo Casarão das Artes.
Ao escolher autores estrangeiros para a festa literária fluminense, Josélia procurou dar visibilidade à produção feminina, convidando a escritora espanhola Pilar del Río, viúva de José Saramago, e a africana Scholastique Mukasonga, sobrevivente dos massacres em Ruanda e radicada na França.
A curadora também chama a atenção para o florescimento de editoras pequenas e de grande qualidade no país.
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