
Siqueira tem três décadas de carreira. Depois de se dedicar à pintura, o mineiro, ainda que produza trabalhos nessa técnica, concentrou-se na cerâmica. A exposição integra o projeto Memória das Artes Visuais.
O curador Rodrigo Vivas explica que a proposta é oferecer uma visão geral da obra de autores com presença consolidada no circuito de arte. “Queremos evidenciar questões trazidas pela permanência de uma pesquisa artística ao longo do tempo”, diz. A opção se deve às poucas oportunidades oferecidas pelo sistema de arte de Minas Gerais de observar, de forma mais rigorosa, as relações entre a produção atual e a criação anterior dos mineiros.
O projeto já promoveu mostras de Mário Azevedo e Paulo Miranda. Além da exposição, prevê o lançamento de catálogo, distribuído para instituições ligadas ao setor.
Vivas diz que os trabalhos de Hélio Siqueira colocam duas questões: a tensão entre utilitário/artístico e entre popular/erudito, além do desafio para a decifração iconográfica das imagens. O primeiro aspecto, explica, evidencia-se na exploração com interesse expressivo da cerâmica, técnica usada para a produção de utensílios. O segundo está na criação de peças de temática religiosa, mas tornando rarefeita a visibilidade dos atributos que identificam os santos. Outra abordagem, só que tensionando o erudito e o popular, está na série de oratórios em cerâmica criada por Siqueira.
O curador diz que essas práticas levam as imagens a se tornarem pura forma. “De outro lado, faz com que a peça ganhe e revele conteúdos até então da experiência religiosa, mas que não são explicitados, como é o caso da sensualidade e até um certo erotismo”.
PINTURA A opção de expor pinturas de Hélio Siqueira, linguagem que o artista diz ter abandonado, veio da vontade de “mostrar algo que foi apagado”, explica Vivas. São paisagens e retratos, em ambos os casos revelando um artista às voltas com exploração – “bem-elaborada”, pontua o curador – de massas e variações cromáticas. “Hélio Siqueira pensa a matéria da pintura”, resume.
O título Uma questão de fé carrega uma ironia, observa Vivas. Além de remeter a motivos religiosos presentes nas peças, alude à enorme dificuldade de realizar exposições com o perfil dessa mostra, que prevê viagens, pesquisa e reunião de obras, com todas as despesas por conta do artista. “Infelizmente, só podemos ajudar oferecendo a infraestrutura para que a mostra aconteça”, lamenta.
Vivas critica a ausência de projetos dedicados a artistas mineiros, mostrando de forma mais ampla o desenrolar dessas carreiras. “Que colaborem para a formação de fortuna crítica sobre a obra e intervenham no circuito de arte, incentivando o debate”, acrescenta.
De acordo com o curador, a dificuldade desse tipo de mostra atinge, inclusive, a pesquisa acadêmica. Estudos históricos são feitos, às vezes até editados, mas apenas episodicamente vêm acompanhados da apresentação pública do material que os subsidiou. “O resultado disso traz a sensação de estudo do passado pelo passado. E obra de arte não deveria ser passado. Ela só ganha sentido à medida que se constrói o diálogo entre o realizado e o presente”, afirma.
Rodrigo Vivas já publicou o livro Por uma história da arte em Belo Horizonte (C/Arte). Em setembro, vai lançar Abstrações em movimento, pesquisa realizada a partir de obras de artistas premiados pelo Salão de Arte de Belo Horizonte na década de 1960.
UMA QUESTÃO DE FÉ
Esculturas e pinturas de Hélio Siqueira. Abertura amanhã, às 19h. Centro Cultural UFMG. Avenida Santos Dumont, 174, Centro, (31) 3409-8290. O espaço funciona de terça a sexta-feira, das 10h às 21h30, e aos sábados e domingos, das 10h às 18h. Em cartaz até 30 de outubro. Entrada franca.