Um mar de lágrimas de alegria. Assim foi o Bloco "Seu Vizinho", que desfilou pela Avenida Mem De Sá, partindo do Aglomerado da Serra, maior favela de Minas Gerais, durante a tarde deste sábado (18/2).



 

Por onde se olhava durante o cortejo, era possível ver pessoas chorando. Homens, mulheres, jovens, adultos, idosos. E o ponto alto da emoção foi durante a execução da música "Principia", do rapper Emicida, que possui o icônico verso “Tudo que nóis tem é nóis”, tomado como mantra pelo bloco. Sob uma chuva de papéis picados e a fumaça amarela, referência ao álbum AmarElo, do músico paulistano, foi difícil conter as lágrimas, se é que alguém esteve preocupado em segurá-las.

Victor Hugo Souza, de 22 anos, fotógrafo do bloco, não segurou a emoção durante a apresentação. “É uma questão de identificação, é um momento em que a gente se enxerga muito. A gente pensa em quem vem antes de nós, nossos pais, nossos avós. Eu sempre me emociono muito nos ensaios, mas agora, assim, foi o ápice da emoção”, explicou.

“É um bloco de favelas, para pessoas faveladas e é isso. Não tem discussão”, completou Victor Hugo.
 

Victor Hugo Souza, de 22 anos, fotógrafo do bloco (Foto: Maic Costa/EM/D.A Press)

 

Melina da Rocha, 35 anos, destacou que o "Seu Vizinho" tem como objetivo mostrar que a favela é mais do que uma parcela da população julga. “Eu compus o primeiro texto do bloco. Tem a ver com a gente ser reivindicado não só como favelados, mas como pessoas que pensam, que sentem, produzem. Esse bloco tem a ver com a gente ser a gente”.



 
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Érica Lucas, 48 anos, do grupo de teatro Morro em Cena, afirmou que o momento é de alívio e alegria após um período difícil vivido nos últimos anos. “É uma emoção absurda saber que depois da mágoa que a gente viveu, da pandemia, deste desgoverno que acabou de sair, a gente está aqui de novo. Com a energia renovada. Com a esperança renovada, com a emoção. Esse carnaval está trazendo essa carga muito maior desse sentimento. É a resistência”.

Tamara Selva, que recitou uma das poesias que levou o público às lágrimas, comentou o momento. “Fazer um carnaval na favela já é uma forma de resistir e isso, por si só, já é algo emocionante. É incrível. Eu escrevi a poesia para o bloco, me apresentei junto com as meninas do Morro em Cena, e assim, eu não contive a emoção. Segurei o tempo todo para não chorar, mas no fim não deu. É lindo de ver, lindo de viver, lindo fazer parte dessas história”, falou.
 
 

Política e resistência

O discurso político, inclusive, apareceu em diversos momentos da folia, principalmente com críticas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e exaltação ao atual presidente Lula (PT) e à sua Ministra da Cultura, Margareth Menezes.




Figuras públicas estiveram presentes no evento, como o rapper Djonga e os políticos Áurea Carolina e Léo Péricles. Léo, que foi candidato à presidência da república em 2022 pelo Partido Unidade Popular (UP), inclusive segurou um cartaz que fazia críticas ao Governo Romeu Zema e à sua gestão em relação à preservação da Serra do Curral.
 

Segundo Léo, a emoção se fez tão presente no "Seu Vizinho" pelo papel de resgate do carnaval para o povo que o bloco assume. “Eu acho que esse bloco é fundamental pois ele resgata um princípio do carnaval que é ser extremamente popular, ancorado nas periferias. O carnaval é do povo, feito pelo povo, para o povo”.

Por fim, Léo Péricles destacou o poder de manifestação que o carnaval dá ao povo periférico e criticou o ex-presidente Jair Bolsonaro. “Carnaval é uma grande manifestação cultural e popular. Inevitavelmente a política vai passar pelo meio. Tanto que houve aqui manifestações muito grandes contra o Bolsonaro, inclusive defendendo que não deve haver anistia nenhuma para ele, que o lugar dele é na cadeia pelos crimes que cometeu. Essas pessoas que estão aqui, em grande maioria dessa favela, e das favelas, sofreram muito sob o governo Bolsonaro”, concluiu.
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