Escritor e comentarista José Trajano participa do projeto Sempre um Papo, em BH

Era fim de tarde da última quinta-feira quando José Trajano atendeu ao telefone em tom ressabiado. Explicou que o Arsenal, clube londrino que adotou durante a longa ausência do América-RJ na elite do futebol, estava em campo e, como de praxe, só lhe fazia sofrer diante da televisão. Naquele instante, Trajano dividia as atenções entre a partida dos Gunners e os últimos preparativos para a viagem de quase nove horas entre São Paulo e Belo Horizonte, de ônibus – mais de meio século de profissão, de viagens ao redor do mundo, não lhe fez perder o medo de avião, dispensando-o sempre que possível. Trajano é o convidado de hoje do Sempre um Papo, às 11h, no Hub Minas Digital, na Praça da Liberdade.

 

Retomamos a conversa 20 minutos depois para falar de Os beneditinos (Alfaguara), a terceira ficção de uma “trilogia ao contrário”, como gosta de dizer o autor. Assim como Tijucamérica (Companhia das Letras, 2015), o novo livro é um mergulho romântico pelo Rio de Janeiro da infância e adolescência do tijucano Trajano. A paixão pelo futebol, em suas diferentes formas, mais uma vez, é o fio condutor.

 

O narrador da trama perdeu o emprego de jornalista, vive só na Mooca, até que uma descoberta lhe desperta o desejo de reunir o São Bento Futebol Clube, formado por ele e seus amigos, todos alunos do São Bento, colégio católico da zona portuária do Rio. Trata-se do Mundial de Walking Football, um campeonato de futebol andando, que permitia jogadores acima dos 60 anos e seria disputado dali alguns meses, em Londres. É a chance que ele procurava para reunir seu antigo time do Colégio São Bento e colocá-los para treinar e vencer o mundial, que também teria a participação dos arquirrivais do Santo Inácio.

 

Há muito de ficção e outro tanto de biografia em Os beneditinos. “O Walking Football realmente existe, tenho dois filhos que moram em Londres (um deles, o jornalista João Castelo Branco, repórter da ESPN) e quis resgatar um pouco desta relação de pai e filho. Mas o livro tem muito de ficção, o que deixa as pessoas confusas. Muitos pensam que estou na m..., que vendi meu apartamento e estou sozinho na Mooca, deprimido. Já me ligaram até oferecendo dinheiro”, conta Trajano, de 72 anos, um dos fundadores da ESPN Brasil, de onde foi demitido em 2016. Hoje, se dedica ao Ultrajano, projeto pessoal que está em todas as redes sociais, e ao Bonde do Zé, no Canal Brasil.

 

A partir das amarguras do narrador, Trajano também trata sobre o momento de desesperança do país, politicamente conturbado, e o desencanto com as mudanças e modernização do futebol. “O Juventus da Mooca tem muito do América da Tijuca. Todo mundo que vem para São Paulo, tem grande apreço. Tem uma torcida jovem, muito aguerridos, que falam de política, de drogas. Ainda tem a tradição do cannoli, da esfirra, essas coisas tradicionais, esse encantamento, que o futebol perdeu.”

 

Voltando ao jogo da última quinta-feira, poucos minutos depois de desligar o telefone, pela primeira vez, o Arsenal sofreu um gol de empate do espanhol Atlético de Madrid, em Londres – o que complicou a situação do clube inglês na Liga Europa. Torcer, definitivamente, não é o verbo mais fácil na vida de José Trajano.

 

Sempre um Papo

Com José Trajano. Hoje, às 11h no Hub Minas Digital – Arena Edifício Rainha da Sucata (Praça da Liberdade, s/nº, Funcionários). Entrada franca.

 

OS BENEDITINOS

José Trajano

Editora Alfaguara

152 páginas

R$ 34,90 (livro) e 

R$ 23,90 (e-book)